quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

MAPA CONCETUAL DE RESPONSABILIDADE PARA PROTEGER OS CIDADAOS

R2P Introdução O MAPA CONCETUAL que aqui acabamos de apresentar, demonstra a importância crucial do R2P em cenários de conflitos, onde os governantes perdem duas capacidades aliciantes: governabilidade e governança conceitos que quão discuti no MANUAL de TEORIA GERAL DE ADMINISTRAÇÃO (TGA) e similares para o uso interno no ISEDEF, que se encontra em oline no meu site, mas por limitações financeiras desde 2013, nada se pode fazer, em termos de impressão na Imprensa das FADM “25 de Setembro”,caros colegas do ISEDEF, (…)! Em caso de duvida, acerca do R2P, ou contribuição para esta discussão, envie a sua opinião em dr.anly1962@gmail.com ou para site www.dr-anly.blogspot.com “CLUBE DE OPINIAO CIENTIFICA” CONTATO POR TELEMOVEL 827138340 ou 840279651

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

DISCUSSÃO SOBRE O CONCEITO DA RESPONSABILIDADE DE PROTEGER OS CIDADÃOS.” EM LIVRE-DOCÊNCIA DO MAJOR DE INF SILVA ANLI”, NO ISEDEF, ANO 2016 Caros colegas do ISEDEF, Académicos, Inteletuais e Similares, tenho imenso parazer de abrir esta discussão “emergente”, que nos levará, mais uma vez, a perceber o conceito da responsabilidade de proteger (R2P), que foi criado em 2001 pela International Commission on Intervention and State Sovereignty (ICISS). Caros colegas, nos Institutos de guerra, por exemplo, ISEDEF e similares, o seu grande emepenho é pesquisar sobre questões de Segurança e Defesa Nacional, para melhor se enquadrar em novos paradigmas, e oferecer cérebros de nivel estratégico e geoestratégico para resolução de problemas de conflitualidade e evitar assim as guerras, e viver-se em paz. Se necessário, potenciar e vender estes cérebros para fins de desenvolvimento sócio-económico a nivel nacional e internacional, (…)! Ora, caros colegas, retomando a nossa discussão sobre a R2P, no espaço de uma década, o princípio foi além do discurso dos ativistas, tendo sido endossado, em 2005, por todos os Estados Membros da Organização das Nações Unidas (ONU), como demonstrei no “MAPA COCETUAL”, em anexo na presente discussão. Caros colegas, tem-se hoje, por exemplo, a aplicação da R2P como justificativa para a intervenção humanitária na Líbia, algo dificilmente pensável há menos de dez anos, em termos de aplicação de forças armadas no terreno para a defesa das populações dum dado país, quando os governantes desse país comete atrocidades contra as suas populações. Esse princípio está ligado, primariamente, à responsabilidade dos Estados de protegerem seus cidadãos contra genocídios, crimes de guerra, crimes contra a humanidade e limpezas étnicas. Caros colegas, há casos, porém, em que esses mesmos Estados encontram-se incapacitados ou indispostos a realizarem tal proteção. Nessas situações, torna-se responsabilidade residual da comunidade internacional dar-lhes assistência, ou empregar medidas que os coajam a proteger a própria população (ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS, 2005). Caros colegas, a rápida difusão do princípio deve ser compreendida num longo contexto em que a proteção dos indivíduos tem sido crescentemente priorizada nas relações interestatais, com o desenvolvimento dos direitos humanos, do direito humanitário e, mais recentemente, do conceito de segurança humana, na opinião de (BADESCU, 2011:37-48). Como ficará claro, o conceito da responsabilidade de proteger e suas implicações estão ainda longe de serem consensuais, caros colegas do ISEDEF. Não se deve, entretanto, ignorar os esforços postos em prática pelos Estados para que algo próximo de tal consenso seja atingido universalmente,(…), caros colegas.. Caros colegas, o referido ganho de importância do indivíduo nas decisões globais, bem como os esforços dos representantes estatais, (…), para que o novo princípio seja expresso de forma cada vez mais clara e precisa, (…), torna a responsabilidade de proteger (R2P), um exemplo das relações humanas de forma universal e consensual, (…), que são, caros colegas do ISEDEF, o cerne desta reflexão de “livre-docência” de Major de INF Silva Anli, no ISEDEF, ano 2016. Portanto, caros colegas, o paradigma desta discussão é“Confiança entre países, Respeito entre pessoas, um respeito que não deve ser concebido pela riqueza dos individuos ou dos países, como eu tinha chamado atenção na anterior refexão sobre aspetos de ESTADO de DIREITO em DEMOCRACIA”. Caros colegas, a R2P não se propõe, afinal, a ser um fator gerador de desconfiança entre os Estados, ameaçando a sua soberania. O que ocorre, como deve ser demonstrado ao longo desta reflexão de “livre-docência”, é uma mudança nas implicações dessa mesma soberania, que passa a ser crescentemente percebida, caros colegas, como uma responsabilidade dos governantes frente a seus governados, (GERBER, 2011:59-72). Ora, caros colegas do ISEDEF, a dimensão do respeito aos indivíduos é perceptível na própria emergência global do princípio, sendo aí o papel dos instituos de guerra ou militar, quer queiramos, quer não queiramos, devem assumir a posiçao da proteção das populações independendemente do modelo governativo. Assim, caros colegas, tal difusão demonstra que a necessidade de prevenir e responder às atrocidades em larga escala, e de garantir condições posteriores para uma paz sustentável, encontra ressonância dentro das mais diversas populações pelo mundo, em especial nos países vulneráveis, que vivem ou sobrevivem por doações internacionais. Caros colegas do ISEDEF, Académicos, Inteletuais e Similares, nesta reflexão de “livre-docência”, portanto, buscar-se-á demonstrar como o princípio da responsabilidade de proteger (R2P), surgiu e desenvolveu-se, bem como os dilemas e dificuldades para seu estabelecimento prático de forma mais consistente universalmente, (…), (…)! (…), caros colegas, para tal propósito, a reflexão inicia-se com uma breve exposição do contexto histórico e normativo que culminou na criação do conceito, bem como dos crimes que são atualmente considerados do escopo da responsabilidade de proteger (R2P). Seguidamente , serão expostas as medidas relacionadas a cada um dos três pilares da R2P: a prevenção, a resposta e a reconstrução, além de alguns dos agentes aos quais cabe sua aplicação universalmente, de acordo com o plasmado da ONU para este âmbito. Caros colegas, em diante verémos dois estudos de caso serão trabalhados: a Líbia e o Iraque. No caso da Líbia, por um lado, foi feita a primeira intervenção militar em nome da R2P sem a concordância do país alvo, (BELLAMY, 2011:87-102). Trata-se, pois, de um importante exemplo de aplicação da doutrina, esclarecendo seus reflexos práticos e alguns dos dilemas envolvidos, (…). Caros colegas, no Iraque, por sua vez, a tentativa desastrada de aplicar o discurso da responsabilidade de proteger à invasão do país é até hoje apontada por ativistas e por críticos do conceito como algo que pode tê-lo enfraquecido enormemente, (RIEFF, 2011:97-114). Finalmente, alguns dos desafios conceituais, políticos e institucionais já entrevistos nas discussões anteriores serão explicitados e acompanhados de possíveis caminhos para sua superação inteletiva no aspeto de entendimento. Vejamos a noção de Responsabilidade de Proteger seu desenvolvimento histórico e fortalecimento do conceito Caros colegas, o conceito de R2P não é antigo, mas depende de muitas outras ideias já estabelecidas anteriormente para fazer sentido. A análise desse conjunto de contextos normativos e históricos possibilita a reflexão sobre onde, como e quando deve ser aplicada a noção de responsabilidade de proteger, da forma mais benéfica possível a todos os agentes envolvidos, (…), de forma inteligente. Um conceito muito importante nos debates ligados a esta temática é o de soberania estatal, que deve ser compreendido em suas diversas nuances. De forma resumida, a soberania dos Estados pode ser analisada pelas óticas interna e externa. A soberania interna consiste na “supremacia sobre todas as demais autoridades dentro daquele território e com respeito a essa população”. Já a soberania externa está relacionada à independência de um Estado “com respeito às autoridades externas” (BULL, 2002:13-17). Caros colegas, é importante retomar o que foi historicamente chamado de Paz de Vestfália, um evento crucial para se compreender o surgimento da percepção de soberania. Os diversos documentos que compuseram a Paz de Vestfália foram assinados durante o século XVII, e contribuíram para a formação da ordem internacional que se conhece hoje. Por meio de tais tratados, por um lado, os Estados tornavam-se soberanos, ou seja, capazes de se afirmarem de forman estável e bem definida com o reconhecimento de outras nações (KRASNER, 2001:23-31), de maneira semelhante à que perdura até os dias atuais. Por outro lado, o princípio da não intervenção ligado à soberania era condicionado pelo princípio cuius regio, eios religio, o qual restringia a liberdade dos governantes de imporem sua religião a seus súditos. Ao longo da história, a proteção dos cidadãos limitaria cada vez mais a percepção de que Estados soberanos são invioláveis (KENKEL, 2008:14-25). Quase três séculos depois, em 1914, eclodia a Primeira Guerra Mundial, primeiro conflito a superar a Guerra dos 30 Anos em dimensão, (EVANS, 2008:51-62). Ao final, a guerra deixou um saldo de nove milhões de mortos entre civis e militares (GRANDE ENCICLOPÉDIA LAROUSSE CULTURAL, 1998: 2859). Tal guerra trouxe como consequência tentativas institucionais para lidar com conflitos nacionalistas potencialmente ameaçadores à segurança na Europa, culminando no regime multilateral de proteção de minorias sob a Liga das Nações, (KYMLICKA, 1995:54-57). O regime, porém, falhou, não resistindo à “manipulação da Alemanha nazista” e se revelando “impotente na contenção do Holocausto” (KENKEL, 2008: 14-19). Ora, a dimensão da Segunda Guerra Mundial (que se estendeu de 1939 a 1945 e teve como saldo final uma catástrofe maior do que a vista na Primeira Grande Guerra) e o choque provocado pela divulgação dos horrores do Holocausto estimulou a criação da Organização das Nações Unidas, em 1945, e a formação de um regime de proteção dos Direitos Humanos. Alguns documentos que marcam esse momento histórico são a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) e a Convenção para Prevenção e Punição do Crime de Genocídio, ambas assinadas em 1948 e que serviriam de alicerce para conceitos como a R2P (KENKEL, 2008:16-21). Posteriormente, caros colegas, o início da Guerra Fria trouxe um cenário em que os agentes condutores do mundo bipolar daquela época utilizavam de intervenções e as mais diversas medidas para assegurar a consolidação do próprio sistema ideológico e para evitar que a ideologia antagônica se instalasse. Foi o caso das ações que os EUA e a URSS tiveram na Guerra da Coreia, no início dos anos 1950 (COLE, 2006:25-72). Além disso, pode-se dizer que o Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) só se tornaria de fato funcional posteriormente à Guerra Fria, visto que o cenário político bipolar, somado ao poder de veto, tornava aprovações de intervenções humanitárias pelo CSNU algo impensável, (BADESCU, 2011:45-59). Caros colegas, após a Guerra Fria, tornou-se central a discussão do intervencionismo. Dessa forma, algumas medidas começaram a ser colocadas em prática, ocorrendo missões de paz em lugares como Somália, Bósnia e Kosovo. Ruanda, por outro lado, deixou de ter o mesmo tipo de tentativa de intervenção graças ao resultado insatisfatório na ação anteriormente ocorrida na Somália (ICISS, 2001:21-26). Percebe-se, pois, que desde seu surgimento a noção de soberania trazia consigo uma tensão entre a proteção de indivíduos, simbolizada por um contrato vertical entre governante e governados, e o princípio da não intervenção (KENKEL, 2008: 13-18). Assim, quando no início dos anos 2000 o conceito da responsabilidade de proteger é formalmente criado pelo relatório da ICISS, tal princípio se baseava não na rejeição da soberania, mas numa adaptação da mesma. Com tal adaptação, o princípio da R2P se afastava da ideia de soberania como controle – soberano como impune e isento de prestação de contas, para uma visão da soberania como responsabilidade de um Estado de garantir o bem-estar de seus cidadãos, apoiado residualmente e apenas em casos extremos pela responsabilidade da comunidade internacional em assisti-lo nesta ação, (KENKEL, 2008: 13-17). Caros colegas, no início da reflexão que dá origem ao conceito de R2P, apresentam-se de forma resumida os principais pontos da responsabilidade de proteger. Esses pontos são distribuídos basicamente em quatro tópicos: princípios básicos, fundamentos, elementos e prioridades (ICISS, 2001:11-21). Caros colegas, os princípios básicos resumem-se à ideia de que a soberania de um Estado implica responsabilidade, e a responsabilidade primária pela proteção de seus indivíduos reside no próprio Estado, ou seja, nos governantes, seja qual for o seu modelo de governança e governabilidade. Caros colegas, além disso, a responsabilidade de proteger toma o lugar do princípio de não intervenção em situações em que a população de determinado Estado estiver sofrendo (ou na iminência de sofrer) sério dano, como resultado de uma guerra civil, insurgência, repressão ou falha da máquina estatal (ICISS, 2001:15-28). Já os fundamentos por trás da R2P incluem o dever do Conselho de Segurança das Nações Unidas, sob o Artigo 24 da Carta da ONU, de manter a paz e segurança internacionais (Carta da ONU, 1945), o que faria dele o órgão considerado mais legítimo para decisões ligadas à R2P, (EVANS, 2008:34-37). Caros colegas, dos elementos da R2P, extraem-se três principais responsabilidades: as de prevenir, reagir e reconstruir (ICISS, 2001:12-15). Esses três elementos de destaque demonstram uma tentativa de dissociar a R2P da mera intervenção humanitária, ainda que a própria ICISS tenha sido criada com o objetivo primário de normatizar essas mesmas intervenções (ICISS, 2001:7-13). Quando se fala em prioridades, caros colegas, tem se desenvolvido o entendimento de que a prevenção é a dimensão da R2P que merece maior dedicação, (EVANS, 2008:14-16), como será visto ao discutirmos em diante. Caros colegas, em Dezembro de 2004, três anos após a criação do conceito, a R2P seria formalmente colocada na agenda da reforma da ONU, no High-level Panel on Threats, Challenges and Change, quando foi endossada como “conceito emergente de que existe uma responsabilidade internacional e coletiva de proteger” (ONU, 2004:202). No ano seguinte, caros colegas, buscando promover o conceito, Kofi Annan, o então Secretário Geral da ONU, publica o relatório “In Larger Freedom”(ANNAN, 2005). Isso motivou o debate sobre o assunto na Cúpula Mundial das Nações Unidas de 2005, gerando a resolução na qual o conceito seria endossado pelo mundo por unanimidade, como modelo inteligente gerador de resultados esperados. O documento gerado na Cúpula enfatizava a prevenção, procurando diferenciar a R2P de intervenção humanitária, (AGNU, 2005), e foi um marco de grande importância para a trajetória normativa do conceito até então, (…), caros colegas do ISEDEF. Nos anos seguintes a 2005, contudo, o conceito da R2P perdia força no cenário internacional. Em contrapartida, o Secretário-Geral das Nações Unidas publicou em 2009 o relatório Implementing the Responsibility to Protect, em que são citados exemplos que poderiam reviver a necessidade da ideia da R2P, dentre eles Ruanda e Camboja. Caros colegas, no relatório, Ban Ki-Moon mostra a responsabilidade de proteger como pautada por três pilares. Em primeiro lugar, a responsabilidade cabe ao Estado; em segundo, é papel da comunidade internacional dar assistência a Estados incapazes de proteger a população. Somente em terceiro lugar, cabe à comunidade internacional reagir, se necessário (KI-MOON, 2009). Essa proposta foi efetiva para que voltassem os debates sobre o tema a partir de 2009, na Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU). Em 2011, a R2P teve um exemplo de utilização pelo CSNU como justificativa para legitimar a intervenção humanitária na Líbia, apontando, apesar dos muitos altos e baixos, alguma consolidação do conceito (BELLAMY, 2011:4-12). Vejamos agora o escopo da responsabilidade de proteger Caros colegas, Académicos, Inteletuais e Similares, é importante notar que o conceito da responsabilidade de proteger não possui aceitação universal, mas se mantém como pauta de debate e ganha espaço crescente nas discussões sobre Direitos Humanos e intervenções humanitárias, (BADESCU, 2011:5-7). Há, certamente, caros colegas, dificuldades na decisão de quando aplicar a R2P, porém é amplamente aceito que ela tem sua aplicabilidade focada em quatro casos de atrocidades, delimitados na Cúpula Mundial das Nações Unidas de 2005. São eles os casos de crimes contra a humanidade, crimes de guerra, limpeza étnica e genocídio (que estão ocorrendo ou na iminência de ocorrer) (AGNU, 2005). Um documento que trata de forma muito clara a ideia de crimes contra a humanidade é o Estatuto de Roma, assinado em 1998. Inicialmente, o documento diz que a concepção atual de um crime contra a humanidade é qualquer ação generalizada ou ataque direcionado a uma determinada população que possuir relação com: assassinatos; extermínio; escravidão; deportação ou transferência forçada de população; aprisionamento ou outras privações severas de liberdades físicas que violem leis fundamentais da lei internacional; tortura; estupro; e escravidão sexual (ONU, 1998:7-14). Quando se fala no conceito de um crime de guerra, deve-se ter como ideia central que apenas um indivíduo pode ser responsabilizado pelas ações de um país ou pelos soldados daquela nação (ROTBERG, 2010). Seguindo essa linha de raciocínio, caros colegas, o conjunto de leis que definem quais são os crimes de guerra são as Convenções de Genebra, que nalgumas discussões fizemos questão de fazer análise, ou se necessário, consultar o “MANUAL DE DIREITO DE GUERRA”, disponivel em institutos para os estudos de guerra, por exemplo, no ISEDEF. Na quarta Convenção, definiram-se os crimes de guerra como: assassinato voluntário; tortura ou tratamento desumano; e o uso de reféns e apropriação de propriedades de forma não justificada pela necessidade militar ou pela lei (IV CONVENÇÃO DE GENEBRA, 1949). Já o genocídio é considerado um dos crimes de guerra mais hediondos, caros colegas. A base principal de como definir um genocídio encontra-se na Convenção sobre a Prevenção e Punição do Genocídio, de 1948. No Artigo II dessa Convenção, apontam-se dois elementos que devem estar presentes para definir um crime de guerra como um genocídio: o elemento mental, que envolve o “intuito de destruir, total ou parcialmente, um grupo nacional, étnico ou religioso” (ROTBERG, 2010: 3-6); o elemento físico, que envolve assassinar indivíduos de determinado grupo, causar-lhes danos físicos ou mentais e afetar deliberadamente suas condições de vida de forma destrutiva, implementar medidas que impeçam o nascimento de novos indivíduos de um grupo e a transferência forçada de crianças de um grupo para outro. Caros colegas do ISEDEF, ao abordar a questão da limpeza étnica, nota-se que não há uma definição legalmente aceita para definir esse conceito. Porém, numa abordagem amplamente utilizada, a limpeza étnica pode ser associada tanto a um crime de guerra quanto a um crime contra a humanidade (ROTBERG, 2010:6-16). Numa definição mais geral, a limpeza étnica é vista como a expulsão de um grupo “indesejado” de determinado local, (BELL-FIALKOFF, 1993:46; ROTBERG, 2010:28). Caros colegas, a aplicação do princípio da R2P a cada uma das situações citadas acima é sempre objeto de grandes debates nos circulos em especial em institutos para os estudos de guerra, por isso, o ISEDEF deve ser o centro desse tidpo de debates. Porém, caros colegas, mesmo quando é decidido que o princípio se encaixa em determinada situação, ainda há uma série de desafios a serem avaliados e superados para que se tenha a efetiva implementação da responsabilidade de proteger, os quais serão tratados em seguida, resumidamente. Implementando a Responsabilidade de Proteger: medidas e agentes atuantes Caros colegas, antes de tudo, a responsabilidade de proteger está sujeita a “avaliar as condições do ponto de vista daqueles que buscam ou precisam de apoio, ao invés daqueles que poderiam estar buscando empreender a intervenção” (ICISS), implicando também a compreensão da responsabilidade primária que o Estado tem para com os seus cidadãos. A comunidade internacional representa, então, um papel secundário de auxílio aos Estados na proteção dos indivíduos contra violações massivas dos direitos humanos, devendo garantir esses direitos quando os Estados se revelam incapazes ou indispostos a fazê-lo (AGNU, 2005). Caros colegas, percebe-se, pois, que igualar intervenção humanitária e R2P é inadequado, pois a primeira é definida como a ameaça ou uso da força além das fronteiras do Estado por outro Estado (ou um grupo de Estados), destinada a prevenir ou encerrar graves violações generalizadas dos direitos humanos dos indivíduos que não sejam seus próprios cidadãos, sem a permissão do Estado cujo território a força é aplicada (HOLZGREFE, 2003:18-29); Portanto, a intervenção humanitária está fortemente atrelada aos meios coercivos, e focada no papel dos agentes externos (EVANS, 2011:6-9). Assim, caros colegas, a responsabilidade de proteger representa uma série de respostas conjuntas entre o Estado e a comunidade internacional, compreendendo desde a prevenção das violações até a reconstrução dos que sofreram com as crises humanitárias, (…). Apesar da aparente estrutura contínua, no processo da responsabilidade de proteger os primeiros passos no combate às crises humanitárias não levarão, inevitavelmente, à ação coercitiva militar. A responsabilidade de proteger, caros colegas, é composta por três categorias de ação que se completam, mas que não são necessariamente encadeadas. Por exemplo, a responsabilidade anterior a uma violação massiva de direitos humanos é a prevenção; a ela devem ser despendidos mais esforços e recursos a fim de esgotar todas as possibilidades ante a consideração de uma intervenção. Responder apropriadamente quando as crises ocorrem ou estão prestes a ocorrer é atribuição da responsabilidade de reagir. Finalmente, há a responsabilidade de reconstruir − e os mecanismos de peacebuilding que envolve a assistência ao Estado que sofreu com a crise humanitária, para promover sua reconstrução, reabilitação e reconciliação, eliminando de maneira definitiva a origem do conflito (PATTISON, 2010:23-26). Caros colegas, vejamos agora a responsabilidade de prevenir A aplicação desta responsabilidade abarca o desenvolvimento de mecanismos efetivos de prevenção. Mas para tal, é necessário entender quais são as principais causas das atrocidades em massa, (…)! Isto é, “abordar as causas das atrocidades em massa significa atacar as causas que constituem fatores de instabilidade subjacentes em um país” (COOPER; KHOOLER, 2008:15-19). Existem inúmeros fatores a serem considerados, como pobreza e desigualdade social, baixo desenvolvimento econômico, rivalidades étnicas e religiosas, corrupção, entre outros, o que dificulta a análise, caros colegas do ISEDEF. O International Crisis Group (ICG), órgão reconhecido internacionalmente pelo suporte ao trabalho preventivo, defende que não existe substituto à altura de uma análise de campo detalhada, que leve em conta os fatores que provocam ou simplesmente ressoam na situação. Assim, caros colegas, identificados os fatores que podem originar crises humanitárias, deve-se desenvolver mecanismos de avisos prévios a eles, ou early warnings. Tais mecanismos são ferramentas analíticas que indicam a probabilidade de eventos ou condições especificadas que podem ocorrer em determinados lugares no futuro (SCHMEIDL, JENKINS, 1998). Baseiam-se em cinco fatores gerais: “história passada, contínuas tensões, a disponibilidade de desenvolvimento de mecanismos, a receptividade à influência externa, e qualidade de liderança” (EVANS, 2008:84); e devem ser considerados na vigilância de países que poderiam cometer violações massivas aos direitos humanos. Respostas Efetivas, como atuar? Caros colegas, responder efetiva e pontualmente a situações que clamam pela prevenção de atrocidades em massa exige eficácia na capacidade institucional, e, sobretudo, vontade política. A ICISS, (2001:5-12) aponta que muitas medidas preventivas, quando partem de outrem, podem ser consideradas invasivas e orienta que todos os esforços devem ser pensados em conjunto com os Estados em questão, e que incluam o seu consentimento. As ferramentas das respostas preventivas são divididas por Evans, (2008:5-8) em estruturais e diretas, correspondendo a seu tempo de ação: médio-longo e curto prazo, respetivamente. Caros colegas, são classificadas também quanto a sua área de atuação: segurança, política, diplomática, legal constitucional, econômica e social. Porém, caros colegas, as medidas estruturais de prevenção podem ser desenvolvidas pelo Estado com ou sem o auxílio da comunidade internacional. Dentre elas, caros colegas, figuram a promoção do desenvolvimento socioeconômico e de boa governança, bem como estruturas constitucionais justas e inclusivas, a participação nas organizações internacionais, o incentivo à educação em prol da tolerância e construção da paz, a garantia do Estado de Direito, o combate à corrupção, e a promoção e a defesa dos direitos humanos, (…). Caros colegas, existem, porém, medidas que só podem ser acionadas pela comunidade internacional. Direcionadas a um caso específico, podem incentivar a prevenção de maneira positiva, na forma de promessas ou tratados, transferência de tecnologia, investimentos ou incentivos fiscais. Negativamente, pode haver aplicação de soft power, bem como o prenúncio de sanções políticas, econômicas e de embargos. A comunidade internacional pode, ainda, atuar como mediadora de tensões, com ou sem a presença de um contingente militar – permitido pelos países envolvidos (EVANS, 2008:6). Por meio dos mecanismos abordados nessa discussão, a ICISS (2001) conclui que a prevenção é uma responsabilidade que deve ser delegada a todos os níveis, nacionais, regionais e globais, com o objetivo de desenvolver uma “cultura de prevenção”. Vejamos caros colegas, a responsabilidade de reagir Caros colegas, quando a prevenção falha, a reação é necessária. Novamente, a responsabilidade pertence primariamente aos Estados, mas diante de sua incapacidade ou conformidade com os acontecimentos, em especial quando governo é o agente causador das atrocidades, a comunidade internacional deve pôr de lado o seu papel coadjuvante. A ação militar coerciva é apenas um dos mecanismos da responsabilidade de reagir, visto que a intervenção “(...) só pode ser contemplada nas circunstâncias mais extremas e incomuns” (EVANS, 2011:11-17). Como explorando medidas pacíficas, caros colegas? Inicialmente, ainda pode-se recorrer às medidas similares à responsabilidade de prevenir, como incentivos econômicos e a diplomacia como peacekeeping, isto é, levar as partes conflitantes a um acordo satisfatório (RASMUSSEM, 1997:23-45). Caso esse recurso não puder ser utilizado ou não obtiver sucesso, o uso de sanções deve ser considerado como primordial. A ICISS (2001), apesar disso, faz um alerta sobre o caráter prejudicial das sanções, pois atingem a população com um todo, e se mantidas por longos períodos, só geram danos à população civil. Propõe a aplicação das smart sanctions, que identificam a liderança ou o grupo responsável pela violação dos direitos humanos e direciona suas restrições especificamente a eles (GIUMELLI, 2007:4-7). A Comissão também sugere de que forma as sanções devem proceder. Na área militar, considera os “embargos de armas e o fim de programas de cooperação e treinamento” (ICISS, 2001:30). Na área econômica, aponta o congelamento dos ativos financeiros de alguns líderes em particular, de grupos ou do Estado, a restrição ao acesso de produtos estratégicos, e embargos aéreos. Por fim, nas áreas política e diplomática, propõe a suspensão da representação diplomática, ou a expulsão do Estado de organismos internacionais, (ICISS, 2001). Além das sanções, pode--se levar o caso à jurisdição criminal internacional para tribunais como a Corte Internacional de Justiça, e tribunais ad hoc como Tribunal Penal Internacional para Ruanda. Militarmente, antes de se falar em intervenção, é preciso falar das operações de peacekeeping, as quais são dotadas de um contingente multinacional, requerem autorização do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) e em geral são comandadas pela ONU. Caros colegas, as operações feitas pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), são alguns dos casos em que a ONU passa o comando das missões para organizações regionais, como pode ser observado na Líbia; mas existiram outros casos como a operação Artêmis realizada pela União Europeia (UE) no Congo (MISSIROLI, 2003). As tropas de peacekeeping, apelidadas de “capacetes azuis”, têm como dever seguir os princípios da Carta das Nações Unidas, e, portanto limitar o uso da força à legitima defesa. Caros colegas, como explorar medidas coercivas? Apesar do evidente esforço na tentativa de evitar o uso da força, existem casos em que não há mais paz para ser mantida, mas ainda há vidas a proteger. Sendo assim, a intervenção humanitária coercitiva (imposição da paz), ou peace enforcement, deve ser considerada. Contudo, para que seja colocada em prática, seis princípios devem ser observados: autoridade competente, causa justa, intenção correta, último recurso, meios proporcionais e perspectivas de sucesso (EVANS, 2008:5-8). Caros colegas, o primeiro deles é a determinação da autoridade competente; em outras palavras, quem pode autorizar a intervenção. O uso da força contra outros Estados foi claramente proibido pela Carta das Nações Unidas, exceto para fins de legítima defesa ou sob autorização expressa do Conselho de Segurança (ONU, 1945, Capítulo VII). Este aspeto fiz referencia na reflexão da minha livre-docência na guerra da 4ª geração, que quão discutimos…(…). Isso que dá ao CSNU poder decisório exclusivo, ainda que órgãos como a AGNU e a União Africana (UA) possam lhe fazer recomendações e demandas (BELLAMY, WILLIAMS, 2004). O segundo princípio refere-se a determinar quais são as causas em que a intervenção é considerada justa, em que reside o princípio basilar para a ação. A ICISS (2001) considera as grandes perdas, reais ou previsíveis, de vida humana, que sejam consequências da negligência, incapacidade, colapso ou ainda de uma ação deliberada de um Estado. Também em grande escala real ou previsível, a limpeza étnica, levada a cabo mediante assassinato, expulsão forçada, atos de terror ou estupro. (ICISS, 2002:32). O terceiro princípio corresponde às intenções das intervenções, que devem ter como objetivo evitar o sofrimento humano (ICISS, 2001:33-48). O quarto princípio é o do último recurso, reforçando que a intervenção humanitária só pode ser utilizada quando todos os outros recursos tiverem sido explorados. A utilização de meios proporcionais (quinto princípio) refere-se à duração, alcance e intensidade da intervenção, que deve proceder de forma mínima, empregando somente os esforços necessários para a proteção dos direitos humanos. Por fim, as prospecções razoáveis indicam que intervenções humanitárias sejam feitas se apresentarem alguma perspectiva de sucesso. Se não for o caso, a intervenção não é justificável, pois contribuiriam apenas para agravar a situação (WHEELER, 2001:8-14). Não sendo possível prevenir ou pôr fim a determinada atrocidade massiva, deve-se ao menos buscar conter a violação e impedir que se espalhe (KI-MOON, 1999: 4). A responsabilidade de reconstruir como se procede? Caros colegas, derivada da reação apresenta-se a responsabilidade de reconstruir. Esta corresponde ao momento posterior à intervenção militar. Trata-se de um “comprometimento genuíno com o auxílio à reconstrução de uma paz duradoura, a promoção de boa governança e o desenvolvimento sustentável” (ICISS, 2002:39-44). Trata-se de um processo estrutural que objetiva manter a paz que foi atingida e evitar a recorrência da circunstância que originou o conflito superado. Nesse sentido, caros colegas, a Comissão entende que os esforços devem ser direcionados ao auxílio da restauração ou melhorias nas esferas de segurança, justiça e reconciliação, e do desenvolvimento econômico-local. Caros colegas do ISEDEF, o papel do peacekeeping no processo de reconstrução é garantir a manutenção da paz no processo de transição pós-conflito, um governo bom e justo, e garantir o estado de direito. Na esfera de segurança, é preciso promover o desarmamento, desmobilização de tropas remanescentes, reintegração e reestruturação das forças de segurança (ICISS, 2001:9-14). Garantir a justiça e a reconciliação significa assegurar que o sistema jurídico seja restaurado, pois, caros colegas, existem casos em que este foi totalmente devastado. Deve-se, ainda, caros colegas, trabalhar para o desenvolvimento econômico. Para tal foi criada a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos (OCDE), que desenvolve programas em parcerias com os governos. Duas organizações internacionais se destacam na área econômica, o Banco Mundial (BM) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) (BELLAMY, WILLIAMS, 2004; 2006). Além disso, caros colegas do ISEDEF, é um mérito da Cúpula Mundial de 2005 a criação da Comissão de Peace Building (PBC), para suprir as deficiências das operações de peacebuilding da ONU. Apesar de todas as dificuldades inerentes a reconstrução, a PBC apresenta uma evolução positiva (COOPER; KHOOLER, 2008), e poderá ser uma ferramenta muito útil para casos como os que serão abordados em seguida neste debate, como tinhamos proposto. Vejamo este estudos de caso, caros colegas do ISEDEF, em especial docentes Caros colegas, sabe-se que há diversas ações possíveis dentro do rol da responsabilidade de proteger além das intervenções militares. No entanto, tendo em vista o alto número de operações deste tipo e que podem, ou não, ser abarcadas pelo conceito de R2P, optei por analisar dois destes acontecimentos, Líbia e Iraque, como anteriormente fiz referência. A escolha das situações a serem analisadas foi pautada, principalmente, na diferença existente entre elas na aplicabilidade de R2P. No evento da Líbia, caros colegas, o governo pode ser descrito como indisposto a proteger, uma vez que não havia um comprometimento por parte dos governantes a proteger a sua população; ou seja, o Estado estava ativamente violando os seus direitos, como demonstrei no MAPA CONCETUAL em anexo na presente discussão. Caros colegas, o evento, relaciona-se diretamente ao conceito de R2P na questão da “responsabilidade de reagir”. Já no Iraque, observa-se uma intervenção que não pode ser abarcada pela noção de” responsabilidade de proteger”, (…)! O que é a Líbia, caros colegas? A Líbia é um país situado no norte da África e, antes de sua independência, em 1952, o território era dividido em três províncias que eram controladas por diferentes nações, (…). Entretanto, a monarquia recém-instituída não obteve sucesso na tentativa de unir diferentes povos no seu território e, em 1969, um grupo de oficiais nacionalistas deu um golpe de Estado no país, derrubando o Rei Idris, na qual Qaddafi foi o mentor do golpe. Caros colegas, a Líbia passa a ser liderada pelo Coronel Muammar Qaddafi (CIA World Factbook, 2011). Em seu governo, Qaddafi monopolizava o controle sobre as Forças Armadas, instrumentos de comunicação e outras instituições governamentais (CIA World Factbook, 2011). A chamada “Primavera Árabe” foi deflagrada em Dezembro de 2010, quando, em sinal de protesto contra a corrupção e maus tratos do governo na Tunísia, um jovem incendiou o seu próprio corpo (SHAH, 2011:143). Após os acontecimentos, que foram difundidos entre os cidadãos de vários países da região, formou-se uma onda de revoltas em todo Médio Oriente, e a Líbia foi um dos países a serem atingidos. Lá, os protestos tiveram início na região leste, local onde Qaddafi sempre possuiu menor apoio. O estopim para este acontecimento foi a prisão de um advogado defensor da causa das famílias de vítimas de um suposto ataque feito pelo governo do ditador líbio em Trípoli, nos anos 90. Assim, protestos em todo o território levaram a uma divisão entre cidades ainda controladas pelo governo ditatorial e as já tomadas pelos rebeldes – mais tarde organizados no Conselho Nacional de Transição (SHAH, 2011:211). Frente a tais acontecimentos, o ditador foi estrito ao afirmar que não abdicaria do poder e, caso necessário, “morreria como um mártir”. Neste mesmo discurso, o líder pediu para que seus apoiantes ajudassem a “limpar o país”, até que os protestantes se rendessem. Após seu pronunciamento oficial, instala-se uma verdadeira guerra civil na Líbia, com bombardeios aéreos aos nacionais, por parte do governo (SHAH, 2011:231). Segundo alguns Estados ocidentais, esta conjuntura na Líbia pode ser definida como um crime contra a humanidade por ser um ataque destinado à população líbia, possuindo relação com assassinatos, aprisionamento e outras privações severas de liberdades físicas que violem leis fundamentais do direito internacional (ONU, 1998). Por ser considerada parte desta categoria, a situação na Líbia insere-se nos tipos de delitos abarcados pela doutrina da responsabilidade de proteger. Em fevereiro de 2011, o Conselho de Direitos Humanos da ONU chamou atenção para a situação no país, que enfrentava graves violações aos direitos humanos, cometidas pelo próprio governo. No mesmo mês, o CSNU aprovou a resolução nº 1970, que explicitamente invocava a responsabilidade do governo líbio de proteger a sua população. Com isso, estabelecem-se sanções para a Líbia como, por exemplo, embargos de armas e congelamento de bens. Entretanto, Qaddafi desconsiderou tais sanções e continuou com a sua atuação rigorosa em relação aos rebeldes. As ações tomadas pelo CSNU compreendem o que é afirmado como responsabilidade de reagir, o que, para alguns, faz com que a situação na Líbia seja compreendida pela R2P (GLOBAL CENTRE FOR THE R2P, 2011:654). Não há consenso, no entanto, sobre o fato de se ter utilizado, ou não, todas as medidas não coercitivas possíveis antes de uma ação militar. De acordo com Mary Stata e Matt Southworth (2011:563), a responsabilidade de prevenir está ausente, uma vez que não se tentou utilizar todos os meios diplomáticos possíveis antes do uso da força. Contudo, é importante lembrar que havia uma iminência de massacre em larga escala à população, e alternativas pacíficas como a diplomacia pareciam utópicas frente à determinação de Qaddafi (GLOBAL CENTRE FOR THE R2P, 2011:145-295). Caqros colegas, ao ignorar as sanções impostas pela ONU, o governo líbio abdicou de sua responsabilidade primária de proteger seus nacionais, passando tal encargo para a comunidade internacional como um todo. Como é muito bem lembrado por Edward Luck (2011:784), Assessor Especial do Secretário Geral da ONU para a Responsabilidade de Proteger, um governo não deve proteger somente aqueles que o apoiam, mas também aos que lhes são críticos e desfavoráveis, além de imigrantes e refugiados. Tendo isso em mente, o Conselho de Segurança da ONU, em 17 de março de 2011, aprovou a Resolução nº 1973, que chama os Estados-membros a tomarem todas as medidas necessárias para a proteção da população líbia. Estabeleceu, também, uma zona de exclusão aérea no país. Atenção maior merece ser dada a esta Resolução, que foi a principal ferramenta para a responsabilidade de reagir e fez com que a situação na Líbia pudesse ser vista como o principal caso da aplicação da doutrina da R2P. Esta foi a primeira vez em que o Conselho de Segurança autorizou o uso da força com o propósito de proteger os direitos humanos sem o consentimento do país envolvido (BELLAMY, 2011:213), invocando a R2P de forma explícita. Por isso, de acordo com Pattison (2011:321), o caso da Líbia pode servir para testar a doutrina que ainda é contestada por alguns membros da ONU. É inegável que a intervenção na Líbia também demonstra que a aplicação do conceito de R2P é influenciada por conveniências políticas, por que invocar tal noção neste país e não dar assistência a Darfur, em meio a sua crise? Logo, muito se afirma a existência de interesses ocidentais nesta ação, o que implicaria o que é denominado “intervenção seletiva” (SHAH, 2011:129). De acordo com Noam Chomsky (2011:235), os interesses geopolíticos em relação a reservas de petróleo encontradas na Líbia são uma das principais razões da ingerência ocidental no país. Dentro dessa mesma lógica, observa-se que esta intervenção se foca na responsabilidade de reagir. Além do mais, alguns autores, como Anup Shah (2011:112-139), lembram que, até o presente momento, praticamente não se tem falado em reconstrução ou peace building no território, o que acaba deixando de lado a questão da responsabilidade de reconstruir. De fato, o CSNU ainda não decidiu o que deve ser realmente feito, somente foi aprovada uma resolução que na altura firmava a permanência das tropas da OTAN até Março de 2012, mas, até janeiro, nada mais se havia decidido. Isso pode fortalecer uma tendência a continuar relacionando esta noção somente a intervenções humanitárias, apesar dos atuais esforços para esclarecer que tal doutrina envolve uma ampla gama de opções políticas e legais (PATTISON, 2011:234-304). De qualquer modo, como afirmado por Zunes (2011:435-502), apesar da existência de críticas e da relativa falta de consenso ainda existente, esta operação é, sim, um marco para a doutrina. É importante destacar que a compreensão global desta noção será diretamente afetada pelo resultado final da intervenção na Líbia caros colegas. Vejamos, o caso do Iraque (…)…,caros colegas, dono de uma história tradicionalmente conturbada, o Iraque é um país localizado no Médio Oriente, que foi, por muito tempo, alvo de invasões imperiais; até as suas fronteiras atuais são uma criação colonial artificial, (…). Pode-se dizer que a sua história moderna começa no pós I Guerra Mundial, quando o país deixou de fazer parte do Império Otomano (que se desintegrou) e passou a ser independente (CIA World Factbook, 2011). A partir de então, o Iraque teve um governo diretamente influenciado pela Inglaterra até meados da II Guerra Mundial, em que se tornou área de influência norte-americana, embora não tenha cortado relações com a União Soviética, (KAUFFER, 2008:25-28). Uma forte crise política marcou a região nas décadas de 1960 e 1970, uma vez que o país estava cada vez tendendo mais para a influência soviética (RAJAMOORTHY, 2003:531). Em 1979, Saddam Hussein assume o poder e passa a contar com o apoio dos Estados Unidos na guerra contra o Irã. Entretanto, após a invasão do Kuwait na década de 1990, o Iraque torna-se alvo de uma coalizão liderada pelos norte-americanos na Guerra do Golfo (CIA World Factbook, 2011). Em 2001, em resposta aos ataques terroristas de 11 de Setembro, o governo norte-americano começou a tomar medidas destinadas a combater o terrorismo, mesmo que, para tal, fosse necessário agir preventivamente, (!!!). Tais princípios norteadores da política externa tornaram-se conhecidos como Doutrina Bush, em referência ao então presidente dos EUA, George W. Bush. Esse preceito ainda afirma que qualquer país que dê abrigo a grupos terroristas deve ser tratado também como uma nação adepta do terrorismo e, consequentemente, os Estados Unidos podem lhe declarar guerra (TUNC, 2009:7-11). De acordo com Johannessen (2008:23-29), foi com base nesses princípios que a coalizão liderada pelos Estados Unidos decidiu invadir o Iraque em 2003, mesmo sem o consentimento do Conselho de Segurança da ONU, já que nunca ficou comprovado que houve ligação entre o Iraque e os perpetradores do 11 de Setembro. Caros colegas, essa ação era oficialmente justificada pelo fato de que o país era acusado de possuir armas de destruição em massa e vínculos diretos com a Al Qaeda, grupo terrorista responsável pelo atentado às Torres Gêmeas. A necessidade de libertação da população iraquiana da ditadura de Saddam Hussein também era vista como um dos motivos da invasão e, após não ser encontrada nenhuma arma de destruição em massa ou vínculo com redes terroristas, tal justificativa passou a ser o principal argumento adotado pelo governo Bush na Guerra ao Terror. Trazer a democracia para o Iraque seria, assim, um dever do ocidente (JOHANNESSEN, 2008). Caros colegas, embora os Estados Unidos tenham usado o imperativo humanitário como justificativa de sua ação, os criadores da R2P e a maioria dos estudiosos não vêem nesse caso uma aplicação concreta do conceito. Em primeiro lugar, é importante lembrar que uma “intervenção militar só pode ser justificada quando todas as opções não-militares para a prevenção ou resolução pacífica da crise tenha sido explorada” (THAKUR, 2006:77-91). Dentro desta lógica, caros colegas, a invasão ao Iraque não pode ser considerada como uma intervenção humanitária, já que mais medidas como sanções econômicas e diplomacia ainda poderiam ser tomadas antes de se interferir no país. Neste caso, pode-se dizer que a ideia da” responsabilidade de prevenir” não foi levada completamente em consideração pela coalizão. Não havia, tampouco, uma ameaça de ataque iminente países membros deste grupo e nem possibilidades verdadeiras de homicídios em massa que pudessem chegar a justificar a intervenção por meio da “responsabilidade de proteger” (ROTH, 2004:42). Outro aspeto notável deste caso é a falta de um plano para a reconstrução do país após a queda do ditador (ocorrida ainda em 2003). Johannessen (2008) afirma que as questões humanitárias não eram o principal foco dos norte-americanos e isso pode ser comprovado pela despreocupação com o desenvolvimento de estratégias para lidar com mudanças socioeconômicas e políticas a serem enfrentadas pela sociedade iraquiana. Grande parte do orçamento da coalizão foi destinada para material bélico, o que deixa a ideia de peacebuilding em segundo plano. Caros colegas, o intuito inicial da invasão era prevenir a continuidade e o aumento da violência, mas, eventualmente, acabou-se seguindo um caminho contrário a esse. Caros colegas, deve-se ter em mente que, numa intervenção humanitária, as tropas devem proteger os civis, não colocá-los ainda mais em perigo (JOHANNESSEN, 2008:432-476). Não houve, assim, uma plena preocupação com a” responsabilidade de reconstruir”. Há afirmações que veem a intervenção no Iraque como um ponto crucial para o aumento do ceticismo em se tratando da responsabilidade de proteger e que, consequentemente, faz com que o futuro da noção seja menos promissor, (…), caros colegas. De fato, com tal invasão, tornou-se um pouco difícil a aceitação da ideia por parte de alguns países, relutantes a acabarem legitimando a invasão (RIEFF, 2011). Entretanto, caros colegas, como é lembrado por Hamilton (2006), os membros da ICISS objetam que essa conclusão é injusta devido ao fato de que, se os princípios de precaução estabelecidos pela R2P tivessem sido seguidos, não haveria justificativa humanitária para invadir o Iraque. Caros colegas do ISEDEDF, é importante ter em mente este argumento, uma vez que, se a responsabilidade de proteger tivesse sido utilizada como ponto norteador das discussões internacionais na época, a conjuntura iraquiana seria completamente diferente da observada atualmente, uma vez que não haveria intervenção alguma, (…), conducente ao conceito de R2P. Desafios e perspectivas para a aplicação do princípio Caros colegas, como foi apresentado ao longo da discussão, o princípio da responsabilidade de proteger apresentou um rápido desenvolvimento desde sua criação oficial pela ICISS, em 2001, até seu uso como justificativa à intervenção na Líbia, em 2011. É inegável, porém, que seu estabelecimento no cenário internacional ainda encontra percalços. Tais desafios são enfrentados tanto no entendimento do conceito em si e suas implicações; quanto no momento de sua implementação. Caros colegas, alguns desses desafios, bem como possíveis perspetivas de solução e consequente aplicação efetiva da R2P, serão apresentados em breve neste debate. Os desafios conceituais Um dos maiores obstáculos à operacionalização da responsabilidade de proteger é o fato de que ainda restam muitas imprecisões no próprio conceito. As discordâncias vão desde a própria terminologia aplicada à R2P até as situações às quais o princípio pode ser chamado, passando pelo leque de medidas que devem ser tomadas em seu nome. Algumas dessas discordâncias serão tratadas a seguir. Quanto à terminologia utilizada, permanecem controvérsias sobre o que é a R2P. A própria Comissão a definia como um princípio emergente baseado num conjunto de fundamentos legais: “provisões de tratados de direitos humanos, a Convenção do Genocídio, as Convenções de Genebra, o Tribunal Penal Internacional e semelhantes” (ICISS, 2001: 50). Já Gareth Evans, um dos líderes da Comissão, o definiria em 2008 como uma “nova norma internacional” (EVANS, 2008: 4). O problema em chamar a R2P por “norma” é que nenhum dos principais documentos referentes à R2P (como o Documento da Cúpula de 2005 e o próprio relatório da ICISS) é vinculante sob o direito internacional (STAHN, 2007:101). Ou seja, se por um lado o cumprimento de tratados que deram base à R2P, como as Convenções de Genebra, pode ser cobrado dos Estados, por outro os documentos que tratam da própria R2P não prevêem punições a Estados que não agirem contra atrocidades em massa fora de seu território. Nesse sentido, Luck (2010) considera a R2P mais um princípio político que legal, cuja relevância deriva da “capacidade de impulsionar a vontade política para implementar padrões internacionais amplamente aceitos e codificados há tempos” (LUCK, 2010: 14). Há, ainda, caros colegas, discordâncias quando se trata das situações para as quais o princípio da R2P deve ser utilizado, (…)! A definição dos quatro tipos de violação massiva de direitos humanos abarcados pelo princípio no Documento da Cúpula de 2005 foi um grande passo para a mobilização de atores políticos (ROTBERG, 2010:263). Diminuíram, assim, tentativas de aplicação inadequada, caros colegas, como para o combate à AIDS e aos efeitos das mudanças climáticas. Afinal, “se a R2P pretender proteger a todos contra tudo, pode acabar não protegendo ninguém contra nada” (EVANS, 2008: 65). Deve-se tentar, pois, manter o escopo da R2P estreito, para que as respostas sejam profundas, abarcando os diversos instrumentos disponíveis (KI-MOON, 2009: 8). Além do estabelecimento de consensos internacionais, como ocorreu em 2005, outro caminho para garantir que o escopo da R2P ganhe definições mais precisas é o debate sobre situações que não se encaixam na doutrina. A invasão ao Iraque em 2003, por exemplo, é apontada por diversos ativistas como um claro mau emprego do princípio (EVANS, 2008:134; BADESCU, 2011:6-7). Como foi explicado ao longo de debate, isso ocorre graças às condições em que a intervenção foi realizada, que para muitos autores impedem que ela seja qualificada como “humanitária”. É o caso, por exemplo, do desrespeito ao critério do último recurso, visto que a invasão militar ao Iraque foi feita antes que todas as outras alternativas fossem exauridas (THAKUR, 2005:602); e do questionamento à existência real de uma atrocidade em larga escala anterior à invasão, indo contra o critério da causa justa (ROTH, 2004:73-136). Além disso, a pouca preocupação com o estágio da reconstrução tanto no Iraque (JOHANESSEN,2008:182), quanto na Líbia (SHAH, 2011:273) põe também em questão o caráter humanitário da atuação internacional nos dois casos. Caros colegas, a delimitação mais precisa dos casos aos quais é aplicável a R2P, bem como os esforços para enfatizar a abrangência do princípio para além da intervenção humanitária, são cruciais para que tal princípio agregue vontade política em torno de si. O estabelecimento de conceitos claramente definidos é fruto de esforços conjuntos dos representantes estatais, organismos internacionais (governamentais ou não), e outros. Contudo, para que a R2P seja implementada de forma efetiva, há ainda outros desafios e controvérsias a serem solucionados, como será visto o debate abaixo. Quais devem ser os desafios à implementação da R2P? Caros colegas, apesar da crescente clareza a respeito do conceito de R2P, restam ainda controvérsias que até o momento têm levado diversos agentes ou atores internacionais a criticá-lo, e mesmo boicotá-lo. Mesmo quando se concorda com a responsabilidade de proteger num plano ideal, ainda se questiona a possibilidade de implementá-la de forma adequada. Algumas dessas controvérsias serão tratadas a seguir, caros colegas. Interesses e seletividade perante a R2P Como já foi dito,caros colegas, um dos méritos da responsabilidade de proteger é sua proposta de retirar o foco dos Estados que intervêm em outros, passando-o para as populações em sofrimento (ICISS, 2001:16). Porém, caros colegas, as ações tomadas com relação às populações necessitadas continuam resultando de decisões dos representantes estatais. A vontade política dos Estados de se envolverem numa operação que visa à proteção humana em outro país pode ser afetada por fatores diversos. Um deles é a proximidade geográfica ao país alvo, o que pode facilitar a difusão dos efeitos das atrocidades entre os territórios, (…), caros colegas. Outro é a cultura política de cada país, que pode se expressar em maior ou menor interesse em financiar operações dentro de outros Estados (ICISS, 2001:214-241). Caros colegas, uma crítica muito frequente à responsabilidade de proteger consiste na afirmação de que, não importando as considerações morais inerentes ao princípio, sua implementação nunca é livre dos interesses dos Estados que intervêm, (…),(???). casos como demonstrados nesta reflexão de livre-docência”,( Iraque e Libia). Nesse sentido, caros colegas, os mais céticos com relação à R2P afirmam que Intervenções (e não-intervenções) desde o fim da Guerra Fria, em situações de catástrofe humanitária motivada politicamente, revelam, na melhor das hipóteses, ambições morais modestas sob limitações políticas, por exemplo, (Timor Leste em 1999, e Serra Leoa em 2002); e, na pior, o uso de forças armadas por justificativas humanitárias para outros interesses próprios, exemplo, (Afeganistão em 2002 e Iraque em 2003), ou indiferença quase total a catástrofes evidentes onde Estados capazes não viram interesse (Ruanda em 1994 e Sudão em 2004 a 2007) (LU, 2007:946-985). Tal visão, caros colegas, segundo a qual a R2P não muda o fato de que não há “proteção humana” livre de interesses nacionais, é forte, principalmente, entre os países em desenvolvimento. É o que defende, por exemplo, o intelectual Noam Chomsky (2009), em sua declaração à AGNU em 2009. Segundo ele, caros colegas do ISEDEF, tal doutrina pode ser aplicada para justificar qualquer satisfação de interesses de um país poderoso, sendo, pois, um novo instrumento das grandes potências para se imporem sobre nações mais fracas (CHOMSKY, 2009). A visão da R2P como ferramenta imperialista dos países do Norte se refletia nas declarações de representantes de países como Nicarágua, Cuba, Venezuela, Irã, Sudão e Coreia do Norte (LUCK, 2010). Esse ceticismo de parte do mundo em desenvolvimento com relação à R2P pode ser explicado pelo fato de que vários desses Estados se percebem numa situação de fragilidade frente ao Norte (KENKEL, 2008:25). Por isso, tais países tenderiam a reduzir a noção de soberania “ao componente da inviolabilidade e da liberdade frente à intervenção, buscando a proteção em relação a ameaças reais do passado” (KENKEL, 2008: 24), como o imperialismo e o colonialismo. Caros colegas, em resposta aos que associam o conceito da R2P a um conflito entre Norte e Sul, em 2009 o Secretário-Geral da ONU, Ban ki-Moon apontava o fato de que, antes que a comunidade internacional endossasse a R2P, suas bases já eram visíveis no Ato Constitutivo da União Africana, (KI-MOON, 2009). A narrativa segundo a qual as bases da R2P teriam surgido antes na África que nos países desenvolvidos encontrou apoio, também durante a reunião da Assembleia Geral das Nações Unidas de 2009, na maioria dos países em desenvolvimento, e principalmente em muitos dos países africanos (LUCK, 2010:66-69). Além disso, o próprio Chomsky reconhecia, ao tratar de intervenções humanitárias em 1993, que se é questionável a possibilidade de os Estados porem em segundo plano os próprios interesses nacionais, indivíduos com frequência priorizam considerações morais (CHOMSKY, 1993-1994). As organizações não-governamentais, nacionais e transnacionais, têm tido um papel crescente, pressionando os Estados a agirem e influenciando os cidadãos a demandarem proteção de seus governantes (ICISS, 2001:2-6). A mídia também tem um papel crucial na mobilização da vontade política nacional e internacional. Ao transmitir em tempo real imagens do sofrimento humano ocorrido a longas distâncias, a mídia gera o chamado “efeito CNN”, afetando a seleção dos casos que receberão maior atenção internaciona (ICISS, 2001:9-14). O crescente papel dos agentes ou atores não-estatais nas decisões referentes à R2P tem, pois, potencial para afastar a implementação do princípio de possíveis interesses estatais escusos. Outro caminho importante é a atribuição das decisões em questão a organismos multilaterais (a nível internacional ou regional). A desaprovação, pelo CSNU, à invasão ao Iraque, demonstra a capacidade deste fórum para tomar decisões baseadas em princípios imparciais: no caso, a falta de provas da associação entre o Estado invadido e a Al Qaeda (JOHANESSEN, 2008:874). Contudo, como será visto a seguir, mesmo dentro de organismos multilaterais ainda se defende a necessidade de reformas, de forma a torná-los mais legítimos em termos de R2P. Vejamos agora o paradigma das Instituições internacionais e sua legitimidade perante a R2P Caros colegas, desde a criação da R2P no relatório da ICISS, as diversas medidas abarcadas sob o guarda- chuva do princípio envolvem agentes os mais diversos, como ONG’s, organismos internacionais econômicos, Estados e indivíduos notáveis, entre outros. Contudo, caros colegas, quando se trata de intervenções humanitárias, as mais controversas medidas reativas, o entendimento comum é de que o decisor mais adequado é o Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU). “A tarefa”, portanto, “não é encontrar alternativas ao Conselho de Segurança como fonte de autoridade, mas fazer o CSNU trabalhar muito melhor do que tem feito” (ICISS, 2001: 49). Na visão de muitos países, caros colegas, principalmente da América Latina, África e Ásia, o CSNU se tornou pouco representativo da comunidade internacional. Para eles, o Conselho exclui de seus assentos permanentes países de tamanho e influência fundamentais, como Brasil, Índia e África do Sul. Uma solução apontada com frequência é a criação de novos assentos (ICISS, 2001). Outra medida proposta por atores internacionais é que os países com assento permanente no Conselho de Segurança (atualmente, Estados Unidos, Inglaterra, China, Rússia e França) abram mão de seu direito de veto em votações de medidas ligadas a atrocidades em massa, a não ser quando tais medidas afetarem seu interesse nacional de modo direto e explícito (BADESCU, 2011:674). Outra fonte de questionamento à ONU são as limitações operacionais enfrentadas por ela, como a falta de tropas em número suficiente e com treinamento adequado (BADESCU, 2011). Essas limitações são consideradas prejudiciais à legitimidade das ações por ela autorizadas e implementadas, principalmente nos casos de intervenção humanitária. O fato de potências militares dominantes estarem quase sempre envolvidas nessas ações, por possuírem as tropas, equipamentos e recursos necessários, é visto como um risco à imparcialidade, já que tais Estados não são necessariamente comprometidos com a doutrina da R2P. Enquanto isso, outros países que de fato endossam o princípio, como o Canadá, em geral não possuem recursos militares suficientes para apoiarem significativamente uma intervenção humanitária (LU, 2007:946-947). Um recurso que tem sido utilizado na superação de tais limitações operacionais é a colaboração entre agentes internacionais e arranjos regionais. Estes são considerados, muitas vezes, melhor posicionados para lidar com questões envolvendo um de seus membros. Afinal, Estados e grupos mais próximos geralmente possuem informações e compreensão histórica e cultural mais detalhada sobre a situação, além de serem mais diretamente afetados pelas consequências da inação (KI-MOON, 2011). Em casos que envolvem o uso da força, porém, suas ações ainda precisem ser autorizadas pelo Conselho de Segurança (ICISS, 2001). Além dos arranjos regionais, uma organização de defesa coletiva que tem ganhado força em operações de paz autorizadas pela ONU é a OTAN, como nos casos do Iraque (BADESCU, 2011:652) e da Líbia. Fica claro, portanto, que apesar dos admiráveis avanços alcançados pelo princípio da responsabilidade de proteger ao longo da última década, ainda abundam desafios a serem superados rumo à sua real implementação. Para o estabelecimento efetivo da R2P na mobilização de vontades políticas nacionais e internacionais, pois, são necessários: a busca por maiores consensos referentes ao conceito, seu escopo e suas implicações; tentativas de afastar progressivamente sua aplicação de possíveis interesses unilaterais; e esforços para que as instituições multilaterais encarregadas de pôr a R2P em prática ganhem maior legitimidade, e tornem-se cada vez mais capazes de uma implementação efetiva, entre outros desafios. A forma de Conclusão, caros colegas Caros colegas, a longa existência de crimes de atrocidade em massa no meio internacional, muitos deles sem uma ação sequer por parte de qualquer outro país, faz com que se possa perguntar o motivo pelo qual as medidas para remediá-los e, principalmente, evitá-los, não são sempre tomadas pela comunidade internacional, que possui capacidade para tal. Tendo em vista este aspeto, as nações se coordenaram visando uma mudança no agir frente a desrespeitos contra os direitos humanos. Mudanças surgidas após o começo de fóruns multilaterais periódicos para a discussão deste assunto foram responsáveis por fazer com que os países não mais tenham carta branca para fazer o que bem entenderem com seus cidadãos, (…). Entretanto, não se deve pensar que o princípio de soberania deixou de ser válido; pelo contrário, ganhou força o entendimento de que essa mesma soberania resulta em responsabilidade do Estado frente aos governados (ICISS, 2001:5-9). Tornou-se, assim, inaceitável, caros colegas, a existência de massacres e limpeza étnica crimes de atrocidades em massa, como um todo. Chegou-se, também, a um acordo sobre o uso unilateral da força, questão que não deve ser tratada com impunidade pelos demais países (ICISS, 2001:9-15). Assim, caros colegas do ISEDEF, surge a noção de R2P, fazendo com que a comunidade internacional tenha o dever de proteger as nações que estejam sofrendo algum desrespeito aos seus direitos intrínsecos, enfatizando a possibilidade de serem vítimas de um dos quatro crimes previstos no Estatuto de Roma. Desse modo, caros colegas, tal conceito faz com que se torne “normal esperar que a soberania estatal não mais seja um “escudo” que permita com que os Estados se escondam para cometer atrocidades de massa” (BADESCU, 2011:167-171). Sabe-se, entretanto, caros colegas, que a R2P possui muitos desafios a serem vencidos para que seja possível a sua implementação apropriada nas práticas internacionais. De fato, há o problema da falta de consenso sobre a sua aplicabilidade, assim como a existência de seletividade sobre em quais países intervir, o que pode ser considerado um dos mais graves problemas a serem enfrentados. Todavia, como é afirmado por Evans (2011:161), há uma boa vontade existente entre os governantes e tomadores de decisão frente à ideia de responsabilidade de proteger, uma tendência a se aceitar esta norma e a garantir que não haja mais falhas de ação. A importância do surgimento da R2P é algo notável, por exemplo, Jubilut (2008:234) afirma que as mudanças oriundas do seu aparecimento são comparáveis àquelas advindas da introdução do Direito Internacional dos Direitos Humanos nas relações internacionais. Para ela, é bem possível que o sucesso da implementação da responsabilidade de proteger traga benefícios que atinjam, também, conflitos entre soberania e direitos humanos; legalidade e legitimidade; e uma reconciliação entre valores de justiça e paz no meio internacional (JUBILUT, 2008:231-251). Muito é afirmado, desse modo, caros colegas, sobre o caráter imprescindível do conceito para que se possa haver um desenvolvimento pleno das práticas humanitárias, com a maior aceitação possível entre os atores internacionais. Caros colegas, a experiência adquirida até hoje demonstra que é difícil mobilizar toda a disposição da comunidade internacional frente à R2P. Entretanto, as ações que estão sendo tomadas dentro do âmbito desta noção são imprescindíveis para que se possa chegar à sua exitosa implementação. Assim como relembra Evans (2011:157), as mudanças não acontecem sozinhas, deve-se fazê-las acontecer, (…). Caros colegas, dentro desse contexto, a responsabilidade de proteger é condição sine qua non para o surgimento de uma nova maneira adequada de agir quer se tratando de casos de genocídios, crimes de guerra, crimes contra a humanidade e limpezas étnicas. Os paradigmas aqui discutidos, não são um fim, em si mesmos, mas servem de meios para que os institutos de guerra repensem as suas ações futuras, nos seus modelos de Responsabilidade de Proteger, mas renovando os paradigmas para contextos reais!(…). Para, os docentes de ISEDEF, qual seria o paradigma emergente na noçao de R2P na conjuntura do HOMEM IDEAL moçambicano? Os fatores que levaram a aplicação de R2P, na Libia e no Iraque, tiveram consenso em termos rigorosos da aplicabilidade da R2P e da ONU? Qual o dilema existente entre os atores Estatais e não Estatais, e ONU para a eficiência e eficácia da R2P? Se tivesse que teorizar a R2P, o que nela traria de novidade? Todas discussões podem ser encaminhadas para dr.anly1962@gmail.com ou para www.dr-anly.blogspot.com “CLUBE DE OPINIAO CIENTIFICA” Meu telemovel: 827138340 ou 840279651 (Silva Anli, Major de INF).

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

DISCUSSÃO SOBRE A GUERRA CIVIL EM ANGOLA,UM CASO AFRICANO. “EM LIVRE- DOCÊNCIA DO MAJOR DE INF SILVA ANLI, NO ISEDEF, ANO 2016 Caros colegas do ISEDEF, anteriormente já tinhamos discutido o caso de guerra civil de Sri Lanka, em Ásia, desta vez vamos discutir o caso Africano, da guerra civil em Angola. Esta reflexão tentará compreender melhor como é o desenrolar das guerras civis em vários campos ou territórios em conflito. Portanto, a guerra é multidimencional, e pode refletir aspetos peculiares,(…), podendo ser convergentes ou divergentes, conforme as politicas de guerras ai decorrentes. Caros colegas do ISEDEF, á semelhança da discussão anterior, o objeivo deste debate é testar as ideias debatidas ao longo das reflexões sobre “as guerras civis”, e neste caso nos centramos todavia, através do estudo da ajuda internacional dirigida a Angola durante a guerra civil. Asssim, caros colegas, começamos por fazer uma breve caraterização do país e uma resenha histórica do mesmo, com o objetivo de enquadrar o conflito no respetivo contexto. Seguidamente, abordamos algumas especificidades da guerra civil que nos ajudarão a compreender o contexto da guerra, designadamente o tipo de relações mantidas entre o Governo (MPLA) e a UNITA, as possíveis causas da guerra e a influência exercida por outros fatores externos, destacando-se o papel das grandes potências mundiais (EUA e URSS) e regionais (África do Sul), bem como de outros atores influentes (Cuba, Ex-Zaire, petrolíferas internacionais) e similares. Fazemos depois uma caraterização global da ajuda, traçamos as principais estratégias seguidas e revemos algumas posições sobre a influência da APD com o objetivo de criar uma base de reflexão sobre o possível impato da ajuda no desenrolar do conflito, caros colegas. Caros colegas, vejamos a caracterização do país A República de Angola localiza-se no sudoeste africano da região austral e faz fronteira com a República Popular do Congo, República Democrática da Congo (RDC), Zâmbia, Namíbia e com o Oceano Atlântico. Ao país pertence também o enclave de Cabinda, situado a norte. O país tem uma superfície total de 1,246,700 km², dos quais 2% têm cultivos anuais, 23% são pradarias e pastos, 43% são bosques e montes baixos e 32% têm outro tipo de fins sustentaveis. Uma longa meseta estende-se até ao litoral. A faixa costeira do país tem 1.600Km. veja aqui:www.guiadelmundo.com/países/angola/introduccion.html; IMF Ilustração de Mapa de Angola O clima é semi-árido no sul e ao largo da costa de Luanda. Já o norte tem invernos frescos. A estação seca é de Maio a Outubro e a estação chuvosa de Novembro a Abril. Angola tem atualmente cerca de 13 milhões de habitantes, dos quais três milhões residem em Luanda. Em termos de religião, cerca de 53% é cristã (38% católicos romanos e 15% protestantes), sendo que a restante população (47%) pratica cultos autóctones. No que concerne a divisões étnicas, 37% são Umbundus, 25% Kimbundus, 13% Bakongo, 2% mestiços (de origem europeia e nativo africano), 1% europeus e 22% pertencem a outras etnias. Os principais idiomas são o português e diversos dialetos do ramo bantú. Angola conquistou a independência a 11 de Novembro de 1975, adoptando, então, um sistema político de partido único. Em 1991, foi alterada a Constituição do país, o que permitiu pôr fim ao sistema monopartidário e ao sistema de economia central e planificada. Em Setembro de 1992, realizaram-se as primeiras eleições livres legislativas e presidenciais. O Presidente José Eduardo dos Santos, no poder desde 20 de Setembro de 1979, obteve 49,6% dos votos, o que implicaria a realização de uma segunda volta (contra Jonas Savimbi). Porém, esta segunda volta nunca se realizou, tendo sido suspensa devido ao reacender da guerra civil. Apesar da abundância de recursos naturais, 70% da população angolana vive na pobreza e o rendimento per capita era de 340 USD em 1997. O seu IDH era 0.403 em 20002. A agricultura, que assegura quase na totalidade a alimentação de subsistência para cerca de 80 a 90% da população rural, representava 8% do PIB em 2001 contra 20% em 1990 (IMF,2003:3-4). A base da economia angolana é o petróleo que contribui em cerca de 50% do PIB, 90% das exportações e 80% das receitas do orçamento de Estado. Existem outros recursos minerais como os diamantes, o minério de ferro, o fosfato, o cobre, o feldspato, o ouro e o urânio, embora só os diamantes sejam explorados e exportados. Caros colegas, o petróleo foi descoberto pela primeira vez onshore na bacia do Kwanza em 1955, tendo a sua produção começado nesse mesmo ano e sendo alargada à costa de Cabinda em 1968. Em 1973, antes da independência, este recurso natural substituiu mesmo o café, tornando-se o maior bem de exportação do país. Hoje, Angola é o segundo maior exportador de petróleo da África Subsariana. Quanto aos diamantes, estão concentrados na zona noroeste do país, designadamente nas áreas da Lunda Sul, Lunda Norte e, no centro, no Bié e Malanje, junto a lençóis de água, antigos cursos de água e vales. Angola é o quarto maior produtor mundial e tem potencial para pertencer ao grupo dos maiores fornecedores de diamantes do mundo, que produzem mais de 10 milhões de quilates por ano. Relativamente às exportações, estas movimentam actualmente cerca de 10 mil milhões de USD, sendo os principais bens de exportação o petróleo (90%), os diamantes e algum café. Os principais destinos são os EUA, Portugal, Brasil, França e Espanha. A dívida externa do país era de 9.9 mil milhões de USD (IMF, 2003:31-34). Vejamos caros colegas, a breve história do país Remontando ao século XV e à descoberta da desembocadura do rio Congo em 1482 por Diogo Cão, foi a partir de então que se deu início à presença portuguesa em terras angolanas. No entanto, caros colegas, muito antes da chegada dos portugueses, as comunidades de língua bantú tinham estabelecido uma economia agrária em quase todo o território e absorvido as populações de língua khoisan nele espalhadas. Além da pastorícia, desenvolveram ainda economias de troca, tendo-se tornado a povoação de M’banza Kongo num dos centos mercados mais bem sucedidos. A leste, a ideologia política dos povos lunda concebia já a formação de um Estado e, no sul, nasceram reinos mais tardios nas terras altas das populações ovimbundu. Em 1951, Angola obteve a categoria de Província do Ultramar, delegando-se-lhe uma administração e recursos próprios. Na década de 50, começaram a emergir movimentos nacionalistas dos quais se destacou, em 1958, o MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola). A luta política contra a força colonial portuguesa foi-se intensificando e mais fusões políticas apareceram, nomeadamente o UPA/FNLA (União dos Povos de Angola/Frente Nacional de Libertação de Angola) e a UNITA (União Nacional para a Independência de Angola). Todos eles competiam pela legitimidade doméstica e pelo reconhecimento internacional, apresentando reivindicações mutuamente exclusivistas de representar toda a nação. Estes aspetos, foram bem discutidos na minha dissertação do ISEDEF, em Outubro de 2015, no capítulo dos movimentos independentistas africanos, mas também caro colega poderá ver nos seguintes sites: www.terra.com.br/noticias/mundo/angola/angola.htm, www.hrw.org/portuguese/reports/angola0803/3.htm, www.guiadelmundo.com/paises/angola/historia.html, www.worldstatesmen.org/Angola.html www.guiadelmundo.com/paises/angola/historia.html. Após quase década e meia de luta armada, iniciada em 1961 e que só terminou em 1974, Portugal negociou a independência da ex-colónia através do Acordo de Alvor em 1975. A 11 de Novembro de 1975, Agostinho Neto, Presidente do MPLA, proclamou a independência do país e a sua constituição como “República Popular de Angola”. O novo Governo foi reconhecido pelos outros Estados africanos, mas não foi aceite pelas restantes organizações independentistas. No mesmo dia, a UNITA proclamou a independência na capital da Província do Huambo, cidade do Huambo. Portugal só viria a reconhecer o Governo do MPLA meses mais tarde, em Fevereiro de 1976, depois de 80 países já o terem feito e quando Angola já estava totalmente controlada pelo MPLA. Começava, então, a guerra civil angolana, que durou mais de 25 anos, isto é, até Fevereiro de 2002, altura em que o líder da UNITA foi morto e esta aceitou negociar um Acordo de Paz (Abril de 2002). Esta guerra rapidamente se internacionalizou devido aos apoios prestados ao MPLA por Cuba e pela União Soviética, e à FNLA e à UNITA, pelo Ex-Zaire, pela África do Sul, pela China e pelos EUA. Em 1977, Nito Alves, um destacado dirigente do MPLA, tentou derrubar o regime de Agostinho Neto através de um golpe de Estado que fracassou, apesar de terem sido mortos vários dirigentes do MPLA. Em seguida, Angola viveu uma época de verdadeira “caça às bruxas”, perseguindo-se, prendendo-se e assassinando-se milhares de pessoas acusadas de pertencerem à fração do MPLA criada por Nito Alves. Em Dezembro desse mesmo ano, o MPLA constituiu-se como partido e adoptou o marxismo-leninismo como base da sua orientação ideológica, transformando-se em MPLA /PT (Partido do Trabalho). Esta transformação do MPLA enfureceu os EUA que continuavam renitentes em reconhecer o Governo angolano e que, por isso, vieram reforçar o seu apoio à UNITA, através da revogação pela Administração Reagan da “Emenda Clark”, que impedia esse apoio aberto e oficial dos Estados Unidos. Dois anos depois, em 1979, após a morte de Agostinho Neto, José Eduardo dos Santos foi nomeado pelo Bureau Político do MPLA/PT seu presidente e do país. A 16 de Fevereiro de 1984, Luanda e Pretória chegaram a acordo, através da assinatura dos «Compromissos de Lusaka», que determinavam a retirada da África do Sul das áreas do território angolano que invadira e ocupara militarmente, e estipulavam a aplicação, até 31 de Março, da Resolução 435 do Conselho de Segurança. Porém, a África do Sul não honrou o seu compromisso. Na sua esteira, em 1989, instalou-se uma Missão de Verificação das Nações Unidas no país – a UNAVEM I. Face às consequências dramáticas de uma guerra ininterrupta, iniciaram-se, simultaneamente, em Londres, conversações quadripartidas entre Angola, Cuba, África do Sul e EUA, que culminaram na assinatura de um acordo tripartido entre Angola, Cuba e a África do Sul em 22 de Dezembro de 1988 e na assinatura dos Acordos de Nova Iorque entre Angola e Cuba, os quais previam a retirada das tropas cubanas para o país. Caros colegas, o ano de 1989 ficou marcado pelo primeiro frente-a-frente entre o Presidente angolano e o líder da UNITA, sob a mediação de Mobutu, que, apesar de ter sido considerado um fracasso, marcou o início das negociações diretas entre o MPLA e a UNITA com vista à reconciliação nacional. Um ano depois, caros colegas, as delegações da UNITA e do MPLA reuniram-se em Portugal e aceitaram calendarizar ações e encontros futuros para construir a paz. A essa reunião seguiram-se outras rondas que culminaram na assinatura dos Acordos de Paz de Bicesse (Estoril) em 1991, com o objetivo de viabilizar a realização de eleições livres no país com a instauração de um sistema multipartidário. Na sequência desses acordos, estabeleceu-se uma segunda Missão de Verificação para Angola – a UNAVEM II que teve como objetivos observar e verificar o processo de desarmamento; apoiar a criação de um novo exército nacional único, supervisionar a desminagem, prover auxílio humanitário e facilitar a extensão da autoridade do Estado a todo o território. Seguindo os ventos de mudança que ocorriam em todo o mundo, sobretudo nos países de leste até então satélites da URSS, e de olhos postos na preparação das primeiras eleições democráticas, o MPLA/PT optou pela abertura económica, com a adopção de instrumentos que permitiam a entrada de capitais estrangeiros, nomeadamente a aprovação da lei de investimentos estrangeiros, e dando início à negociação com o FMI. Caros colegas, o novo sistema político e económico viria a ser estabelecido pela Lei Constitucional de Abril de 1991: fim do regime de partido único e do sistema económico de direcção centralizada e implantação do multipartidarismo e de um sistema económico de economia de mercado. As eleições ocorreram um ano depois, em Setembro de 1992, sob a supervisão da ONU, saindo vencedor o MPLA. A UNITA contestou os resultados, acusou o Governo de fraude eleitoral e reiniciou a guerra no país, a qual duraria até 2002, com uma breve interrupção em 1994 na sequência dos Acordos de Paz de Lusaka, que consistiram num aprofundamento do Acordo de Bicesse, com maior rigor e controlo nas medidas de calendarização do cessar-fogo, da reconciliação nacional e formação das Forças Armadas, a par da aceitação dos resultados eleitorais pela UNITA. Caros colegas, a ausência de Jonas Savimbi na assinatura dos acordos indiciava, porém, algumas dificuldades com as quais o seu cumprimento iria confrontar-se. Foi também nesse ano de 1994 que os EUA reconheceram o Governo de José Eduardo dos Santos. Já em 1995 e depois de os Acordos de Lusaka terem sido negociados e facilitados pela ONU (ao contrário do que tinha acontecido nos Acordos de Bicesse), estabeleceu-se a UNAVEM III. Na sequência do estipulado nos Acordos de Lusaka, foi aprovado em 1997 o Governo de Unidade e Reconciliação Nacional (GURN), onde os deputados da UNITA eleitos em 1992 tomaram posse. Esse primeiro Governo integrou quatro ministros e sete vice-ministros da UNITA. Nesse mesmo ano, a ONU aplicou sanções contra a UNITA por não respeitar os acordos de paz, que incidiram no encerramento das suas delegações externas e na limitação de movimentos dos seus dirigentes. O ano de 1998 ficou marcado pelo reinício da guerra em grande escala. Face a esta situação, o MPLA afirmou não estarem reunidas as condições necessárias para a realização de eleições gerais em 2001, como exigia a oposição civil. Também nesse ano e face ao expirar do mandato da UNAVEM III, foi criada a Missão de Observação das Nações Unidas em Angola (MONUA), cujos esforços foram minados com a rápida deterioração da situação militar no país. Segundo MATOS (2002:91), a fase final da guerra foi marcada por uma crescente divisão de opiniões nos meios políticos e militares quanto à melhor forma de pôr fim ao conflito. Os defensores de uma oposição forte e estruturada que fizesse face a um Governo forte e empreendedor consideravam que a UNITA estava derrotada e que o Governo deveria convidá-la a estabelecer a paz. Uma outra corrente defendia que a guerra deveria ser levada até ao fim, ambicionando mesmo o aniquilamento total da UNITA, que não parecia capaz de se transformar numa oposição forte e democrática. Finalmente, caros colegas, em Fevereiro de 2002 e após quase três décadas de guerra, de milhares de mortes e deslocações em massa, Jonas Savimbi foi morto. Dois meses depois, no dia 4 de Abril, a UNITA e o Governo assinaram um cessar-fogo (Memorando de Entendimento de Luena), pondo fim ao sangrento conflito angolano e dando início a uma nova era. Já em Agosto de 2002, caros colegas, foi estabelecida a Missão das Nações Unidas em Angola (MNUA) com o objetivo de presidir à Comissão Militar Conjunta reinstalada, fornecer 30 observadores militares para monitorizar as áreas de aquartelamento e coordenar os esforços humanitários das várias agências da ONU. Caros colegas, a situação militar em Angola influenciou bastante a economia do país, na medida em que as repercussões das ações militares que incidiram sobre alvos conómicos ou criaram dificuldades para a manutenção da atividade de alguns setores económicos como a agricultura e transportes, tendo sido particularmente visíveis ao nível macroeconómico através do Orçamento Geral do Estado (OGE), do PIB e da dívida externa. Terminados quase 30 anos de guerra civil, as infra-estruturas de Angola ficaram em ruínas: centros de saúde, hospitais e escolas foram destruídos. O mesmo aconteceu às pontes, a um grande número de barragens e estradas, resultado de uma estratégia de destruição pela UNITA de infra-estruturas e da produção nas zonas sob controlo governamental. A agravar esse cenário, caros colegas, está a existência de milhões de minas terrestres que continuam espalhadas pelo interior do país, apesar dos avanços das equipas de desminagem. O fim do conflito trouxe também inúmeros desafios ao país, nomeadamente o retorno e a reintegração de milhões de deslocados internos, de refugiados nos países vizinhos e dos ex-combatentes deslocados durante a guerra. Caros colegas, os números indicam que, em 2003, mais de dois milhões de deslocados internos e cerca de 25% dos refugiados externos já tinham retornado às suas terras de origem, sendo que, no final do semestre de 2004, o Governo deu por acabada a operação de reintegração dos deslocados internos e o fim dos campos de combatentes, restando ainda um número considerável de deslocados em países vizinhos. Infelizmente, estes movimentos de retorno têm causado centenas de mortos e feridos, principalmente devido ao elevado número de minas terrestres espalhadas pelo país, estando muito dependentes da ajuda humanitária, principalmente mulheres, crianças e outros grupos mais vulneráveis, caros colegas. Segundo a Human Rights Watch, os refugiados angolanos, cuja maioria se exilou na RCD e na Zâmbia, retornaram espontaneamente a Angola, apesar dos seus recursos limitados e do risco de extorsão nas fronteiras do país e noutrospontos de controlo. Durante o percurso de regresso, vários refugiados afogaram-se ao tentar atravessar rios e, nas áreas de fronteira mulheres e crianças foram vítimas de estupro e de outras formas de abuso sexual. Especificidades da guerra civil e suas causas em Angola Caros colegas, é usual apontar-se como a maior causa da guerra civil em Angola a existência de recursos naturais valiosos. Segundo dados de 1995, Angola é o vigésimo país mais dependente de recursos minerais (não petrolíferos), com uma dependência de 3.6 (rácio das exportações de minerais não petrolíferos face ao PIB). Quanto aos países dependentes do petróleo, Angola é o primeiro da lista com uma dependência de 68.5 (rácio das exportações de petróleo, gás ou carvão face ao PIB). Como notam certos autores, uma das formas de fazer e manter a guerra num dado país é a riqueza que o movimento da guerrilha detém (líder da guerrilha). Para COLLIER et al. (2003:73-83), essa foi a situação prevalecente em Angola, na medida em que Jonas Savimbi tinha meios financeiros para apoiar o movimento rebelde. Ainda segundo COLLIER et al. (2003:141-149), no início da década de 90, a UNITA tinha já obtido receitas provenientes essencialmente da exploração de diamantes avaliada em cerca de 4 mil milhões de USD. MEIJER (2004:3-8) explica que essa situação foi exacerbada pela emergência de uma elite corrupta e enriquecida, após a abertura “democrática” do início da década de 90, com fortes interesses que dificilmente seriam desmantelados. De salientar que, segundo o autor, apesar de os recursos terem permitido sustentar os esforços de guerra, “isso não significa necessariamente que tenham sido a fonte ou o motivo do conflito”. ROSS (2002:2-9), por seu turno, explica que a dependência dos recursos naturais promove a guerra civil de quatro formas: (1) prejudicando a performance económica do país, na medida em que reduz o crescimento e aumenta a pobreza; (2) tornando o Governo mais fraco, corrupto e menos responsável; (3) dando às populações dessas regiões um incentivo para formar um estado independente; (4) financiando os movimentos rebeldes. No caso de Angola, o petróleo foi a fonte do Governo para financiar a guerra, enquanto os diamantes financiaram a ação da UNITA. Porém, a influência dos recursos naturais em Angola não terá sido sempre linear. Segundo ROSS (2002:20-25), durante a Guerra Fria e o Apartheid na África do Sul, a UNITA foi apoiada e financiada pelos EUA e pela África do Sul. Só com o fim da Guerra Fria, os rebeldes angolanos perderam os financiadores externos e passaram a depender muito mais fortemente dos lucros dos diamantes. Segundo o WORLD BANK (2003:4-11), a UNITA tinha já perdido força antes da morte de Savimbi, não apenas devido à perda de território, mas também devido à campanha internacional promovida contra o contrabando dos diamantes. Até então, foi o valor relativo dos recursos controlados que manteve a força das partes opostas após o fim do apoio de financiadores externos, indica o WORLD BANK (2003:4-15). O processo Kimberley tratou-se de uma iniciativa privada das grandes companhias do setor dos diamantes, que teve como objetivo estabelecer regulamentação económica sobre o comércio de diamantes e criar um sistema de certificação de diamantes em bruto. Os participantes no processo acordaram em estabelecer medidas de controlo interno para evitar o conflito na importação e na exportação de diamantes nos respectivos países, bem como implementar ou reforçar a certificação e de penalizar os transgressores. Em Angola, esta medida conseguiu diminuir a obtenção de financiamento por parte dos rebeldes. No encontro de Otava, em Março de 2002, os participantes tinham-se mostrado confiantes no respeito pelo prazo de implementação das medidas acordadas. Porém, logo após a aprovação da Resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre o processo Kimberley, os Estados-membros da EU admitiram não conseguir cumprir o compromisso até Fevereiro de 2003. Ainda assim, segundo COLLIER et al .(2003:175-187), essa medida ajudou a alcançar a paz em Angola e noutros países em situação semelhante. O desejo de secessão de Estado pelos rebeldes é a outra principal razão da guerra. CARVALHO (2002:160) explica que “o desejo de Jonas Savimbi era o poder político absoluto, não olhando a meios para o alcançar”. Assim, prossegue o autor, “gorada que foi a hipótese de alcance legítimo do Poder, o recurso foi a opção armada, que (tal como se sabe) não era defendida por todos quantos integravam a direcção da UNITA”. Quanto aos argumentos utilizados pelos rebeldes, Savimbi afirmou, nas suas últimas declarações públicas, que uma das razões da luta da UNITA era a “conquista da cidadania para todos os angolanos”, como indica PACHECO (2002:43-49). A este propósito, o autor admite que “embora nunca tivesse concordado com as suas opções políticas e, sobretudo, com os métodos que utilizou para as concretizar, devo reconhecer que a preocupação com a cidadania faz todo o sentido quando se analisam as causas do conflito e se questiona o futuro dos angolanos”. Mas existem outras causas que explicam a guerra. CACETE (2002:167-169), parece convicto de que “fatores internos como a exclusão social, a exclusão económica e a exclusão política, foram importantes para a manutenção das tensões internas e para a mobilização da rebelião. A diversidade étnica “desempenhou um papel insignificante no conflito, apesar de reter o potencial para fraturar a vida social angolana”, defende o WORLD BANK (2003:4-7), tendo as partes beligerantes procurado o apoio de grupos étnicos rivais: a UNITA teve o apoio dos Ovimbundu, o MPLA dos Kimbundus e o FNLA dos Bakongo. Será também importante referir a questão da corrupção política, associada à existência de recursos naturais. Segundo o WORLD BANK (2003:6-11), “o acesso privilegiado a contratos do Estado, agências reguladoras, parcerias estrangeiras, infra-estruturas de saúde e educação de elite, bens estatais privatizados e o crédito subsidiado e a moeda estrangeira, enriqueceram alguns à custa de muitos”. Esta situação, afirma, terá provocado uma ineficaz alocação dos recursos, elevados níveis de consumo e um clima de negócio marcado pelo favoritismo, pelas transacções associadas e por outro tipo de práticas não transparentes e distorcidas, para cenários de “lavagem de dinheiro”. Do lado do Governo, as razões para o conflito foram sempre atribuídas a outras entidades, afirma CACETE (2002:165-169), designadamente “ao imperialismo americano e aos racistas sul-africanos, no quadro da Guerra Fria; ao mau perder e à ambição de Savimbi, depois de 1992. Ou seja, o Governo ao longo deste tempo eximiu-se de quaisquer responsabilidades no conflito e, com base na guerra, também do modo como geria o país”. Também FERREIRA (1999:287-288) afirma que “a guerra é entendida mais como uma agressão da África do Sul do que um problema de cariz interno personificado na UNITA (que obviamente contava com o apoio, decisivo muitas vezes, sul-africano)”. Caros colegas, o autor chama ainda a atenção para a “sistemática minimização das responsabilidades oriundas da política económica adoptada e do próprio sistema económico em que ela assentava no que concerne ao diminuto desempenho económico nacional”. Durante a guerra, caros colegas, o Governo empenhou-se num único objetivo, diz CACETE (2002:165-176): “manter o controlo do Poder” e, por isso, “a exploração de recursos naturais como o petróleo e os diamantes cresceu desenfreadamente; foram utilizadas avultadas somas na aquisição dos meios militares, no lobbying junto de Governos influentes, na corrupção e na manutenção de clientelas subjetivos”. A este propósito, CARNEIRO (2002:38-41) afirma que “alguns dados relevantes podem ilustrar (...) a mistura particularmente sensível de desenvolvimento de um nsistema rendeiro com uma guerra de destruição sistemática imposta pelo Ocidente (e terminada quando, do exterior, se consideraram preenchidas as “condições” para o seu término)”. O autor explica, caros colegas, que os anos 90 foram marcados, no domínio económico, por duas circunstâncias capitais, designadamente a aplicação de um modelo de acumulação privado, que, de resto, foi condição si ne qua non dos Programas de Ajustamento Estrutural (PAE), e pelo reforço de uma lógica rendeira em plena guerra. Exemplo disso, é o fato de Angola ter reforçado a dependência das receitas fiscais em relação ao setor petrolífero de 83% em 1993 para 86% em 2000. A questão da internacionalização da guerra civil tem imperativamente que ser abordada quando se analisa o caso de Angola. MESSIANT (2004:2-7) afirma que os interesses externos em Angola desempenhavam um papel crucial desde a guerra pela independência, na medida em que “embora não tenham sido eles a criar divisões no seio do nacionalismo angolano (...), muito seguramente exacerbaram-nas concomitantemente”. CARNEIRO, (2002:39-47), por seu turno, considera que “não só a Guerra Fria constituiu um fator fundamental conducente a uma verdadeira destruição do país até um passado recente, como o relativo peso da inserção do país no sistema global de aproveitamento de recursos minerais e ,em particular, a sua integração na definição do sistema estratégico de aprovisionamento de crude por parte das potências ocidentais, nomeadamente dos EUA, são determinantes como elemento tendencial de geração de relações concretas de dependência e extroversão, caros colegas”. Em suma, caros colegas, e citando o INTERNATIONAL CRISIS GROUP (2003), apesar de se tratar de uma guerra entre o MPLA e a UNITA, esta foi “exacerbada pela diversidade étnica e racial, pela geografia, pela política da Guerra Fria e pelos interesses exteriores pelos seus recursos naturais”, ao que se deveria acrescentar as investidas internas que se desenvolveram de um lado e de outro desde a independência do país, (…). Paradigma da influência das grandes potências mundiais na guerra civil de Angola Caros colegas, a situação política de Angola foi particularmente complicada durante a Guerra Fria, quando todos os assuntos mundiais eram vistos na óptica da luta EUA/URSS, afirma SOLOMON (2002:53-61). Caros colegas do ISEDEF, Académicos e Similares, a internacionalização do conflito angolano foi marcada pelo apoio de Moscovo e de Havana ao Presidente marxista José Eduardo dos Santos e ao MPLA, enquanto Jonas Savimbi e a UNITA receberam o apoio ocidental dos EUA e da África do Sul do Apartheid. Segundo GUIMARÃES (2002:287-288), “Savimbi não passou de um instrumento aos americanos e sul-africanos”. O autor afirma que é inegável que Washington, ajudado ou mesmo empurrado por Pretória, tenha procurado, em 1975, impedir a tomada de poder pelo MPLA. Porém, caros coloegas, como não conseguiu esse objetivo, trabalhou para derrubar o Governo angolano dando apoio militar e financeiro à UNITA, especialmente durante as administrações Reagan e Bush sénior. Para os EUA, o MPLA era sinónimo do reforço da capacidade de projeção da União Soviética, enquanto que, para o regime branco da África do Sul, representava uma ameaça à sua sobrevivência e continuação do Apartheid na região. Mas, caros colegas, afirma GUIMARÃES (2002:287), “aqui também há o reverso da medalha”, na medida em que Moscovo “claramente, também se aproveitou da situação proporcionada pela guerra civil, a qual conseguiu trazer a bom porto graças à disponibilidade cubana de enviar tropas e consolidar militarmente a posição do MPLA”. Como conclui o autor, “naquela época jogava-se xadrez”. Caros colegas, quanto ao MPLA e à UNITA, terão reformulado e promovido a sua rivalidade e a sua luta pelo poder como parte da competição ideológica da Guerra Fria, podendo, assim, “colocar-se inextricavelmente nas estratégias das superpotências e chamarem a si o apoio necessário para atingirem os seus fins, que, de resto, já existiam muito antes da internacionalização do conflito”. Nesta perspectiva, GUIMARÃES (2002:287) afirma que “é difícil concluir quem era verdadeiramente o instrumento, se a UNITA para os Estados Unidos, se os Estados Unidos para a UNITA”. A venda de armamento a Angola reflete bem o tipo de influência exercida pelas grandes potências, designadamente pela URSS. Segundo OHLSOM & SKONS (1987:187-189), Angola foi o sexto país de destino da venda de armas soviéticas no conjunto dos países do Terceiro Mundo (4.8% do total) e o primeiro na África Sub-Sahariana no período entre 1982 e 1986. Caros colegas, os autores indicam ainda que, no mesmo período, Angola foi o 14º importador mundial no conjunto dos países do Terceiro Mundo (1.7% do total) e o primeiro da África Sub-Sahariana. No final da década de 80, o novo contexto geoestratégico implicou um novo relacionamento da URSS com os EUA e influenciou decisivamente o curso dos acontecimentos em Angola. Segundo URQUHART, “uma tendência cordial (no relacionamento) entre as duas superpotências é, sem dúvida, um fator crucial na criação de um contexto global no qual acordos pacíficos de conflitos podem ser estabelecidos, e sobreviverem”. Pelo contrário, SOLOMON (2002:53-91) afirma que “a queda do muro de Berlim em Novembro de 1989 e o fim da Guerra Fria libertaram o mundo dos constrangimentos da bipolaridade global e a política mundial parece estar a seguir uma trajetória mais turbulenta”. No caso de Angola, caros colegas, isto significa que, quer o MPLA, quer a UNITA, se envolveram num sistema de comércio livre, isto é, saque desenfreado pelo acesso aos benefícios dos recursos naturais, que terá causado mais obstáculos do que oportunidades para a paz. O autor, numa interpretação polémica, explica que “o que foi antes visto como uma luta ideológica se transformou numa luta étnica”, na qual Savimbi se assumiu como o representante dos Ovimbundu (o maior grupo étnico) e dos Chokwe, enquanto o MPLA representava os Mbundu e Mestiço (com descendência mista). Outros atores terão estado envolvidos na extracção do petróleo e dos diamantes a partir de 1975, como indica ANDERSEN (2003:8-12). No entanto, caros colegs, foi principalmente a partir de 1990 que as petrolíferas internacionais mostraram um grande interesse no petróleo angolano, o que terá influenciado o conflito, na medida em que “o Governo usava os lucros do petróleo para financiar o estado de guerra contra a UNITA”. Além disso, e apesar de cada grupo (militares das FAA do Governo e UNITA) ter controlo sobre um dos recursos, ANDERSEN (2003:7-17) afirma que ambos “dependiam das redes internacionais para converter as reservas de petróleo e diamantes em lucro. Por outras palavras, a autora sustenta que “os autores externos podem ainda desempenhar um papel no conflito em Angola. Paradigma da influência política da ONU na guerra civil angolana Como já referimos, caros colegas, as Nações Unidas estiveram presentes no país através de Missões de Verificação. Em 1989, instalou-se a UNAVEM 1. Estabelecida pela Resolução 626 (1988) de 20 Dezembro de 1988, esta missão teve como objetivo verificar a retirada faseada e total da tropas cubanas do território angolano, de acordo com o calendário estabelecido entre os dois Governos. Essa retirada foi completada a 25 de Maio de 1991, mais de um mês após a data prevista, e a 6 de Junho do mesmo ano o Secretário-Geral das Nações Unidas reportou ao Conselho de Segurança que o mandato da UNAVEM I tinha sido concretizado eficazmente. A UNAVEM II estabeleceu-se na sequência da assinatura dos Acordos de Paz de Bicesse e durou até 1995. Essa segunda missão foi estipulada pela Resolução 696 do Conselho de Segurança da ONU a 30 de Maio de 1991. Era constituída por 350 observadores militares não armados, 90 observadores de polícia não armados (que aumentaram depois para 126) e 100 observadores eleitorais que aumentaram para 400 durante as eleições). Segundo PAULO (2004:1-8), o seu papel era meramente de observação e verificação. Mais tarde, a Resolução 747 prolongou o mandato da UNAVEM II e aumentou o seu orçamento eleitoral. A UNAVEM III instalou-se em 1995, após Lusaka, e durou até Junho de 1997, com a presença de 7.000 capacetes azuis. PAULO (2004:4-9) afirma que “a maioria dos angolanos consideraram a UNAVEM III e a sua sucessora mais modesta, a MONUA, inúteis e incapazes de lidar com a busca incansável de poder por parte da UNITA ou de impedir as violações dos acordos, inclusive o rearmamento de ambas as partes”. Segundo PAULO (2004:7-9), a MONUA tinha uma força militar muito reduzida, com apenas 1.500 homens. Durou de 1998 a 1999 e, em Fevereiro desse ano, o Governo angolano requeriu o seu encerramento, tendo apenas permanecido em Luanda o Escritório das Nações Unidas que se limitou a tratar de questões humanitárias e do reforço da capacidade institucional. Por fim, caros colegas, em Agosto de 2002, foi estabelecida a MNUA pela Resolução 1433 do Conselho de Segurança. O seu papel foi, porém, restringido pelo Governo no período pós-Luena, na medida em que as áreas de aquartelamento eram administradas e controladas somente pela UNITA e pelas FAA, sem a presença dos 30 observadores. Além das missões de observação, a ONU adoptou uma série de sanções contra a UNITA, de 1993 a 1997, entre as quais a proibição de aquisição de equipamento militar e produtos petrolíferos; o bloqueio de viagens ao exterior dos seus funcionários e o encerramento dos seus escritórios no exterior, restrições às viagens aéreas e marítimas a zonas da UNITA; o congelamento de contas bancárias da UNITA; e a proibição da exportação direta ou indireta de diamantes ilegalmente extraídos, segundo PAULO (2004:5-9). Foi ainda constituído um Comité de Sanções que se terá mostrado ineficaz face às violações constantes da UNITA e à cumplicidade de muitos países, empresas e negociantes individuais. MESSIANT (2004:10-18) acrescenta que as sanções foram mais severamente aplicadas a partir de 2000, após as primeiras vitórias militares do Governo e com o argumento de que a UNITA era a principal responsável pelo impasse. PAULO (2004:5-13) explica que, ainda assim, “foi sob a vigilância deste regime de sanções que o resultado líquido de venda de diamantes da UNITA terá atingido cerca de 1,72 biliões de USD” e “os seus funcionários viajavam sem impedimentos, especialmente em África, e continuaram a exprimir-se livremente no mundo exterior através dos seus representantes oficiosos”. A este propósito, MESSIANT (2004:9-19) refere um aspeto igualmente importante. Para alcançar o seu objetivo de neutralizar a UNITA politicamente, o Governo beneficiou do fato de ser o poder legítimo e da rebelião se recusar a desarmar. Ora, “sendo a comunidade internacional o garante da sua legalidade e dos acordos, e estando indiferente às realidades das práticas de governação do MPLA, o Governo pôde aproximar-se de uma série de parceiros estrangeiros poderosos e contar com a aquiescência de uma importante seção da real comunidade internacional na sua guerra – tendo apoio político substancial, mas também através de apoio militar discreto de alguns países amigos”. Porém, a ambição do Governo foi ainda mais longe, diz MESSIANT (2004:10-12), querendo que a comunidade internacional lhe conferisse oficialmente legitimidade para fazer a guerra e para pôr fim a qualquer tentativa de diálogo com a UNITA. Caros colegas, a autora explica que a ONU não seguiu totalmente este desejo do Governo, recusando o reconhecimento da UNITA Renovada ou declarando Savimbi um criminoso de guerra, mas, ainda assim, pôs fim a todos os contatos com a UNITA e encerrou todas as suas delegações externas. O Comité de Sanções do Conselho de Segurança chegou mesmo a tentar eliminar todas as suas formas de expressão política da UNITA. Caros colegas, a autora acusa ainda as Nações Unidas de terem abandonado o seu mandato original (busca da paz através de negociações) e inclusivé cessado os esforços de entregar ajuda humanitária nas zonas controladas pela UNITA (ação que constituía sua obrigação à luz do DIH) devido à sua ansiedade em desempenhar um papel importante no desfecho da guerra e em evitar que o caso Angola fosse considerado um fracasso. Esta posição da ONU (além da aplicação de sanções à UNITA) foi “um verdadeiro contributo para o esforço de guerra do Governo, dificultando o acesso da UNITA a bens de primeira necessidade e forçando-a a viver dos seus próprios meios”. O resultado, diz MESSIANT (2004:10-19), foi uma verdadeira tragédia humanitária. A Ajuda internacional e sua influência no conflito angolano A descrição estatística da APD refere-se a 1975-2002, isto é, a todo o período da guerra em Angola desde a independência. Segundo os dados da OCDE, o total da APD neste período foi de 4.043 milhões de dólares. O gráfico abaixo mostra essa evolução ao longo dos 27 anos de guerra em Angola. Gráfico ilustrativo da APD dada a Angola por ano e por tipo de 1975 a 2002 Caros colegas, como podemos verificar, a ajuda aumentou ao longo dos 27 anos, embora tenha tido descidas acentuadas das quais se destacam as de 1977 com uma descida de 53 milhões em relação ao ano anterior, de 1984 com uma diminuição de mais de 42 milhões de USD, de 1988 com uma diminuição de 93 milhões, de 1992 com um diminuição de 158 milhões e de 1993 com 155 milhões. Destaque-se, por fim, a descida de 95 milhões de 1998 para 1999. Verifica-se a predominância dos donativos oficiais da APD (75%). Essa tendência é melhor identificada no gráfico abaixo, onde se verifica também que 19% da ajuda corresponderam a empréstimos e 6% a outros fluxos oficiais de ajuda multilateral. Os outros tipos de APD e o investimento de capital não têm expressão no gráfico. Gráfico ilustrante do peso relativo dos vários tipos de APD dada a Angola de 1975 a 2002 Relativamente aos principais sectores para os quais foi canalizada a APD, se fizermos uma divisão da APD por dois períodos, o primeiro até 1989 e o segundo a partir do momento em que se perspectivava já um acordo de paz (1990), obtemos resultados diferentes em termos da priorização da ajuda sectorial. Gráfico do peso relativo da APD por sector a Angola de 1975 a 1989 Entre 1975 e 1989, a ajuda teve como principal destino a indústria, exploração mineira e construção (23%), seguida da agricultura, florestas e pesca (19%) e da assistência alimentar excluindo ajuda alimentar de emergência (18%), como indica o gráfico ilustratido acima. Já no pós-Guerra Fria, houve uma mudança na estrutura da ajuda face à alteração das próprias características da guerra em Angola. Passou a predominar a assistência humanitária (auxílio, assistência alimentar, não alimentar) com um total de 28%, seguida da agricultura, florestas e pesca (10%) e da energia (9%), como podemos ver no gráfico abaixo. Gráfico ilustra peso relativo da APD por sector a Angola de 1990 a 2002 Fonte: Elaborado pela autora a partir de OECD (act :2004a), Base de Dados. Já caros colegas, o gráfico abaixo permite visualizar a evolução da ajuda bilateral e multilateral durante a guerra angolana por doador (no quadro da OCDE). Gráfico APD Bilateral e Multilateral dada a Angola por doador (1975-2002) Os principais doadores bilaterais foram a Suécia (766 milhões de USD), a Itália (374 milhões de USD), a Holanda (316 milhões de USD) e a França (292 milhões de USD). Ao nível multilateral, verificamos a primazia da UE (FED) com 749 milhões de USD, seguida da IDA com 266 milhões e do AfDF, com 120 milhões de USD. Por último, o gráfico abaixo ilustrado mostra a evolução no tempo da APD pelos seis principais doadores destacados atrás. Gráfico ilustra a evolução da APD (1975-2002) pelos 6 principais doadores (OCDE) a Angola Caros colegas, até 1977, os fluxos de ajuda são pouco significativos. A ajuda da Suécia começou a destacar-se logo desde 1979, atingindo o maior valor de sempre em 1988. A partir de 1982 / 1983, começam a registar-se diferenças comportamentais entre doadores, destacando-se a intervenção da França e a Suécia na década de 80. Nos primeiros anos da década de 90, a IDA contribuiu fortemente com a APD para Angola, já que foi partir de 1989 que o país se associou ao BM. Desde essa altura, a CEE, a Suécia e a Holanda actuaram de forma semelhante, embora com vários picos. A APD atingiu o seu máximo nos anos de 1987/88, 1991, 1992 e 1996. Quanto à identidade dos doadores, o WORLD BANK (2003:18) destaca ainda o papel do PAM, bem como o de outras agências das Nações Unidas, designadamente a UNICEF, o ACNUR e o PNUD. Relativamente aos tipos de ajuda dada a Angola, o WORLD BANK (2003:18-21) indica que tem sido principalmente cruzada a (1) ajuda humanitária, focando a ajuda de emergência, através das Nações Unidas e das ONGs, fora das estruturas do Governo, com a (2) ajuda ao desenvolvimento, apostada na reforma política e institucional e canalizada através das estruturas governamentais. Assim, caros colegas, segundo o WORLD BANK (2003:18-21), a ajuda da ONU centra-se nos Apelos Consolidados (CAPs), dos quais a maior parcela é canalizada para o PAM. Parte do montante é agora também utilizado para financiar a Iniciativa LICUS do Banco Mundial. A UE, por sua vez, prioriza a saúde e a segurança alimentar rural, bem como questões de gestão macro-económica, democratização e DH. Os EUA têm canalizado a ajuda humanitária através do PAM e a ajuda ao desenvolvimento através de projectos de agricultura, segurança alimentar, cuidados de saúde, democracia e DH. A ajuda norte-americana para a transição centrou-se na saúde, na agricultura e ainda no apoio logístico às Nações Unidas. Da parte do BM, ao qual Angola se juntou em 1989, tendo obtido nessa fase crédito da IDA350, e por entre as elevadas expectativas de paz e de reforma económica, foram aprovados vários projectos para Angola até Outubro de 2002, através da IDA, sete dos quais no período entre a assinatura dos Acordos de Bicesse em 1991 e o retomar da guerra nos finais de 1992. O oitavo projeto foi aprovado seis meses mais tarde; o nono nos finais de 1995, após a assinatura do Protocolo de Lusaka; o décimo no início de 1998 para apoiar o esperado retorno dos deslocados, e o décimo-primeiro em Junho de 2000. Esta ajuda ascendeu a um total de 310.8 milhões de USD e, destes projetos, apenas o último, designado “Fundo de Acção Social”, se manteve activo até 2004. As estratégias da ajuda internacional e os principais tipos de ajuda Caros colegas, começando pela ajuda humanitária a Angola, parece-nos importante sublinhar o fato de, em Abril de 1993, ter sido estabelecida em Angola a Unidade de Coordenação da Assistência Humanitária (UCAH) pelo Departamento de Assuntos Humanitários, numa altura em que as ONGs precisavam urgentemente de coordenação. Caros colegas, o objetivo era analisar o esforço humanitário internacional, à luz das resoluções do Conselho de Segurança e de outros corpos intergovernamentais das Nações Unidas. A primeira direção dessa Unidade priorizou a negociação do acesso das atividades humanitárias, através do lançamento do Apelo Consolidado por forma a aumentar os fundos para a ajuda humanitária e obter a confiança e a boa vontade dos parceiros humanitários e das partes no conflito. A UCAH tornou-se pró-ativa na identificação de problemas, na auscultação dos parceiros e na busca de soluções. Segundo BALL & CAMPBELL (1998:3-4), os coordenadores humanitários alcançaram um ponto de equilíbrio na busca de soluções através do consenso e ao evitar soluções insatisfatórias. Estes mesmos autores indicam que a comunidade internacional reconheceu a importância de manter uma distinção clara entre os actores humanitários e a vertente político-militar da missão de manutenção de paz das Nações Unidas. Caros colegas, as atividades humanitárias não podiam ser manipuladas pelas partes no conflito, nem podiam ser usadas pelos negociadores como recompensa ou castigo. No caso de Angola, a UNITA via a UNAVEM com hostilidade e desconfiança depois de o MPLA ter vencido as eleições em Setembro de 1992 e de o Conselho de Segurança ter atribuído à UNITA a responsabilidade do conflito renovado em 1992. No entanto, BALL & CAMPBELL (1998:4-8) afirmam que “tem sido claramente benéfico para a UCAH o fato de manter a sua distância das instituições políticas das Nações Unidas”. Também PAULO (2004:6-8) sublinha que “a UCAH desempenhou um papel positivo numa ocasião em que não havia qualquer sinal iminente de cessar-fogo e em que as condições humanitárias estavam em deterioração” e afirma que esta “foi bem sucedida ao ganhar acesso aos que necessitavam de ajuda, primeiramente no Kuito e Huambo e, mais tarde, noutras partes do país”. O autor explica ainda que o sucesso da UCAH se deveu ao facto da sua missão ser puramente humanitária. MUL (2002:335-339), coordenador da ajuda humanitária da ONU, afirma mesmo que “a operação humanitária em Angola é vista como uma das mais eficazmente coordenadas no mundo”, na medida em que 10 agências da ONU, 100 OIs e mais de 300 organizações nacionais trabalharam em estreita colaboração com 11 departamentos e ministérios do Governo e nas 18 províncias, numa estrutura de coordenação construída ao longo de 10 anos. Ainda assim, BALL & CAMPBELL (1998:8-15) admitem que houve uma falha na resposta internacional que só começou a ser corrigida em 1997. Por exemplo, nunca foi concebida uma abordagem abrangente de reintegração dos refugiados, ex-combatentes e deslocados de guerra. Apesar disso, o WORLD BANK (2003:17-27) salienta que várias agências das Nações Unidas, OIs e ONGs, mantiveram a sua presença em Angola, mesmo nos tempos de guerra, focando essencialmente actividades humanitárias (distribuição de ajuda alimentar, assistência médica, pequenas reparações de infra-estruturas e apoio a pequenas actividades produtivas). Esta posição manteve-se após a Reunião de Doadores em Bruxelas em 1995, na sequência do Protocolo de Lusaka, que reuniu um donativo de mais de mil milhões de USD para a ajuda ao desenvolvimento, o qual foi posteriormente retirado devido ao fracasso do processo de paz e à falta de uma agenda de reforma clara. Por entre o leque de doadores internacionais, o BM desempenha um papel fundamental de apoio ao complexo processo de transição em Angola para uma economia de mercado, estável e democrática. O WORLD BANK (2003:20-29) explica que esse apoio é dado em três áreas fundamentais: (1) a concepção e implementação de programas de recuperação pós-conflito, incluindo a desmobilização e a reintegração; (2) a mobilização atempada de recursos de apoio à recuperação pós-guerra; e (3) o aprovisionamento de “actividades analíticas e de aconselhamento” que ajudem a definir a agenda de longo prazo para alcançar o crescimento, reduzir a pobreza e melhorar a governação. Caros colegas,o objetivo do BM é combater os desequilíbrios macroeconómicos sem recorrer aos empréstimos de ajustamento, criar mecanismos de distribuição de serviços transparentes e responsáveis e alcançar o consenso entre o Governo e os seus parceiros de desenvolvimento sobre as reformas futuras. Segundo o WORLD BANK (2003:20-28), é imperativo que o Governo angolano e os doadores acordem um conjunto de prioridades de intervenção, prioritariamente a nível dos sectores sociais, de modo a assegurar a estabilidade e a iniciar a reforma económica. Foi nestes objectivos que se centrou a “Estratégia de Apoio Transitório”, iniciada em 2003 e organizada em três pilares: (1) aumento da transparência, eficiência e credibilidade da gestão pública de recursos; (2) expansão da distribuição de serviços às vítimas da guerra e a outros grupos vulneráveis; e (3) preparação para um crescimento económico em benefício dos pobres. Caso o Governo angolano não alcance os indicadores de progresso preconizados, o BM poderá descomprometer-se com o país de forma progressiva, consoante a gravidade do fracasso. Assim, por exemplo, se o programa de ajuda fracassar, os empréstimos serão cortados progressivamente no futuro. BALL & CAMPBELL (1998:8-11) consideram que a estratégia ideal de abordagem da crise deveria ser objectiva e o produto inicial do processo do Apelo Consolidado. Os primeiros CAPs (um em 1993, dois em 1994 e um em 1995) motivaram o trabalho conjunto da ONU com as ONGs de forma a planear uma estratégia que reflectisse os objectivos dos parceiros humanitários. Porém, apesar de os CAPs reconhecerem a complexidade da coordenação e do desenvolvimento de um programa de ajuda durante a guerra civil, foram limitados na sua referência à complexidade estrutural da crise angolana. Além disso, “a relutância ou inabilidade em mencionar a crise institucional em Angola e as relações políticas e económicas que contribuíram para os problemas humanitários e para a crise complexa em Angola, minaram o CAP enquanto documento estratégico”, acrescentam BALL & CAMPBELL (1998:8-14). Por último, as autoras sublinham que “as atividades e negociações humanitárias podem e devem apoiar a paz e os esforços de construção de paz”. Para tal, as estratégias políticas e humanitárias e as actividades da comunidade internacional devem partilhar informações por forma a facilitar a coordenação entre os actores humanitários. No entanto, o coordenador humanitário não deve envolver-se directamente nas negociações políticas, sob pena de pôr em causa a sua imparcialidade e neutralidade. O paradigma de ajuda humanitária VERSUS o desenvolvimento em Angola Caros colegas, a ajuda humanitária não deve ser dissociada da reabilitação e da ajuda ao desenvolvimento, assistindo-se pouco a pouco ao esbatimento desta linha rígida. No caso específico de Angola, essa análise “permite identificar uma emergência inconsequente durante a guerra misturada com tentativas de reconstrução e estabilização da economia sem qualquer preocupação de coerência, e prenhe de optimismo”, segundo afirma LOPES (2002:57-61). O autor considera que “de fato, a emergência não teve qualquer preocupação em criar sustentabilidade económica”, esclarecendo que este tipo de ajuda se baseia na distribuição de alimentos e na atribuição de meios precários de habitabilidade, sem atender, sublinha, a questões como a utilização dos recursos internos e ao reforço do capital humano e das condições de trabalho. Em suma, afirma, “a reconstrução consistiu em projectos sem atender a um programa integrado visando o desenvolvimento”. Enquanto isso, acrescenta LOPES (2002:57-62), “o esforço governamental do Governo esteve concentrado na guerra, com dupla função de manutenção de poder político e constituição de poder económico”. A dada altura, o autor questiona-se: “em que perspetiva alinhará a comunidade internacional, aqui entendida como o conjunto dos grandes blocos políticoeconómicos e financeiros? As várias intervenções internacionais em Angola têm conjugado interesses geoestratégicos com interesses económicos precisos, do que resultou a guerra e a mineralização da economia. Assim, afirma LOPES (2002:59-72), “as ajudas humanitárias e a cooperação têm funcionado sobretudo como capital de influência para a dinamização das relações económicas internacionais numa perspectiva exógena”. Ao contrário de Angola, caros colegas, que não tem estratégia de desenvolvimento própria, nem sequer consensos sobre política externa, o exterior sabe o que pretende do país, podendo assim “conflituar (relação bilateral) e harmonizar (através dos organismos internacionais: sistema das Nações Unidas e instituições económicas e financeiras internacionais) os seus interesses e conduzir a sua intervenção global”. Paradigma da influência da ajuda no conflito angolano Caros colegas, a educação e a saúde em Angola estão em declínio desde 1980, indica ANDERSEN (2003:15-24). Em 1995, apenas 5% das despesas públicas foram canalizadas para a educação, enquanto 31% foram usadas na defesa. FERREIRA (1999:259-269) explica, por sua vez, que “com o agravamento da situação militar e tendo em atenção que a defesa do país passava pelo desempenho das forças armadas, o ascendente que estas começaram a ter sobre a vida política e económica do país, foi uma consequência lógica”. PEREIRA (2002:27-36) acrescenta que a desculpa de que a guerra dificultava o desenvolvimento socioeconómico e que o esforço para a defesa nacional devorava grande parte do OGE tornou praticamente inerte o empresariado nacional, criou uma falência total do parque industrial, não promoveu políticas agrícolas de subsistência e (...) contraiu uma colossal dívida externa”. O autor acusa mesmo o Governo de ter atacado marginalmente os problemas do país, “descurando as questões básicas e os verdadeiros fundamentos da justiça social e em seu lugar promoveu políticas paternalistas que fizeram surgir um rápido crescimento de acções pouco abonatórias, como a falta de transparência na gestão da coisa pública e a prática de corrupção, hoje praticamente institucionalizada”, (LOPES, 2002:59-73). FERREIRA (1999:317-329), por sua vez, explica que as despesas militares angolanas dependiam de financiamentos externos, mesmo estando inscritas no OGE. Essa situação foi particularmente evidente quando o país se socorreu da importação para garantir o armamento indispensável e um leque de bens e serviços que não conseguia garantir. A satisfação da procura interna do setor da defesa teve, assim, que ser, na sua quase totalidade, garantida pela importação, o que fez com que a dívida externa militar atingisse valores significativos. Neste sentido, “as despesas militares tiveram um impato negativo pelo desvio de recursos do investimento produtivo”. ZUMBA (2001:125-139) explica que esse fenómeno (agravamento da dívida externa) se deve a “uma insuficiência crónica da poupança para financiar as novas aplicações de capital geradores de desenvolvimento”, associada a um “deficiente sistema financeiro angolano e à existência de baixos rendimentos das famílias e empresas”. É neste contexto que a assistência externa assume um papel importante, produzindo um efeito superior na taxa de crescimento da economia quando esta é mais limitada pela escassez de divisas do que pela poupança interna. Em contrapartida, o autor sublinha também que a APD em Angola foi alocada prioritariamente para sectores improdutivos de assistência humanitária e de emergência, pelo que, e recorrendo ao Modelo do Dual Gap, o seu impacto no desenvolvimento económico e social terá sido diminuto. A OXFAM INTERNATIONAL (2001:1-10) alerta para o fato de (no início do século XXI) os gastos públicos em serviços sociais (saúde e educação) continuarem “a representar apenas uma ínfima fracção comparativamente ao que é gasto com a guerra”. E prossegue: “o Governo de Angola não despende o suficiente com a ajuda humanitária, não obstante o facto de existirem milhões de angolanos em carência” . Além disso, “o Ministério da Assistência e Reinserção Social (MINARS) não é claro relativamente ao montante que o Governo atribui à ajuda humanitária. De acordo com as fontes do PNUD, o Governo atribuiu 3.4% do seu orçamento ao MINARS em 2001, cobrindo a ajuda humanitária, salários e custos administrativos. Mas a quase completa falta de transparência impede qualquer progresso de tentar discernir quanto e onde é gasto o dinheiro”. Assim, uma grande parte da população depende das organizações humanitárias que distribuem géneros alimentares365, o que, segundo ANDERSEN (2003:16-25), reflete o pouco apoio dado pelo Governo angolano à população. Também SHANNON (2003:40-54) afirma que as ONGDs internacionais se tornaram cada vez mais os principais fornecedores de muitas das funções centrais do Estado, particularmente de ajuda humanitária e principalmente na década de 90, substituindo-se ao Estado até Fevereiro de 2002. A autora explica ainda que, na sequência da nova lei de liberdade de associação e de expressão, houve uma vaga súbita de estabelecimento de ONGs locais em Angola, o que levou os doadores internacionais a canalizar a ajuda através destas. Neste cenário, também alguns indivíduos ou elites estabeleceram ONGDs da sociedade civil, com ligações muito ténues aos cidadãos em nome dos quais atuavam. Dependentes dos fundos internacionais, essas ONGDs tenderam a desenvolver todo o tipo de atividades que os doadores desejavam financiar, em vez de se especializarem numa determinada área de trabalho. Além disso, mostraram-se fracas em termos de gestão, de capacidade logística, de diversificação dos fundos e de experiência prática na implementação de projectos. O resultado foi o afastamento dos fundos internacionais que passaram a ser canalizados através de OIs, cerca de 90% dos fundos até Abril de 2002, segundo SHANNON (2003:41-49). “Na prática” conclui a autora, “isto significa que o desenvolvimento angolano foi fortemente moldado à imagem e à semelhança do sistema de valores da comunidade internacional”. A agravar essa situação está o fato de apenas 10 das 88 ONGDs registadas no Fórum das ONGs Angolanas (FONGA) trabalharem explicitamente no desenvolvimento de capacidades, segundo indica SHANNON (2003:41-48), sendo que as restantes 78 trabalham apenas na ajuda de emergência. Questionamo-nos se as OIs não terão contribuído, ainda que inconscientemente, para o prolongamento da guerra em Angola, ao substituírem-se ao Estado angolano nas suas obrigações em sectores básicos e ao “dispensarem-no” da sua obrigação de financiar esses mesmos setores. Ainda assim, note-se que, em 2001, a OXFAM International (2001:1-8) recomendava que os doadores aumentassem as suas provisões para a assistência humanitária ao país, “tendo em conta a escalada do sofrimento humanitário resultante da intensificação das acções militares”. Há ainda outras dificuldades ligadas à ajuda internacional. Quanto aos deslocados e refugiados, por exemplo, o Governo angolano terá desenvolvido esforços juntamente com a OCHA no sentido de integrar na legislação nacional os Padrões Operacionais Mínimos para o Reassentamento dos Deslocados. Porém, como indica a OXFAM INTERNATIONAL (2001:6-7), “o reassentamento tem muita carga política. Lamentavelmente, desde Agosto de 2000, não houve nenhum caso de reassentamento que tenha sido cabalmente executado ao abrigo da nova lei” e “os funcionários do Governo não se esforçaram o suficiente para assegurar que as necessidades das populações isoladas ou realojadas pudessem ser avaliadas para possibilitar a prestação de ajuda de emergência. Quanto à questão das forças militares da UNITA, o processo de integração destas nas FAA após Luena “permitiu ao Governo angolano consolidar a sua vantagem ao dar prioridade àqueles considerados como uma ameaça potencial ao processo de paz – generais e oficiais mais antigos da UNITA que poderiam ser comprados, isolando-se definitivamente as tropas dos seus líderes, afirma PARSON (2004:1-15). Conclusões da discussão Caros colegas do ISEDEF, do início da luta armada colonial iniciada em 1961 até à sua independência, Angola viveu 14 anos de guerra. Após 1975, mergulhou de novo num estado de guerra – agora civil - durante 27 anos, que matou milhares de pessoas, motivou a fuga de milhões de refugiados e deslocados, destruiu infra-estruturas sociais e de saúde e espalhou pelo país minas que ainda hoje vitimizam os angolanos. As origens mais profundas da guerra civil em Angola recuam ao tempo da luta de libertação nacional, sendo que as causas mais recentes remontam a 1975 quando, na sequência da independência do país, o MPLA subiu militarmente ao poder, sem o reconhecimento das restantes organizações independentistas. Nessa altura, surgiram os primeiros confrontos entre o Governo, a FNLA e a UNITA, cada uma das partes com apoios externos. A guerra dividiu-se em três fases. De 1975 a 1989, uma guerra civil com um carácter essencialmente internacionalista, tendo os EUA e a África do Sul apoiado a UNITA e Cuba o MPLA. Após uma tentativa de restabelecer a paz com os Acordos de Bicesse em 1990/91 e da realização de eleições em 1992, a UNITA contestou os resultados e reabriu as hostilidades, dando início à segunda fase da guerra civil que durou até 1994, ano em que as partes estabeleceram os Acordos de Lusaka, dando tréguas durante alguns anos. De 2000 a 2002, ocorreu a terceira fase (e última até à data) da guerra, que terminou com a morte do líder da UNITA e com a assinatura do Memorando de Entendimento de Luena em Abril de 2002. Caros colegas do ISEDEF, a guerra em Angola foi fundamentalmente uma guerra de luta pelo poder alimentada pelo petróleo e pelos diamantes, tendo o primeiro sido a fonte de financiamento do Governo e o segundo da UNITA. Se a UNITA não olhava a meios para alcançar o poder, tendo como estratégia a destruição total dos recursos do inimigo, o Governo, por sua vez, embrenhou-se nesta luta eximindo-se das suas responsabilidades sociais e políticas de governação para com o povo angolano. O resultado foi a destruição de um país que teria (e terá) recursos suficientes para eliminar a pobreza se os gerisse de forma transparente e correta. Vários fatores terão agravado o conflito. São eles a exclusão social, económica e política, a corrupção política e também a diversidade étnica, estando eles naturalmente associados à ambição de poder e riqueza das partes beligerantes. Caros colegas, verificámos que a influência de potências internacionais foi enorme, principalmente durante o período da Guerra Fria. Após 1989, a guerra terá perdido parte do seu carácter ideológico, passando também a contar com o maior interesse das petrolíferas internacionais. Analisámos a influência de cariz essencialmente político exercida pelas Nações Unidas através de alguns dos seus instrumentos de intervenção e de pressão: as missões de observação e verificação; as sanções económicas e políticas aplicadas à UNITA e ainda a legitimidade dada ao MPLA pela forma como a ONU se assumiu publicamente contra Savimbi e a UNITA, tendo mesmo chegado ao extremo de parar a ajuda humanitária às zonas controladas pelos rebeldes. Reflectimos também, caros colegas, sobre a importância da ajuda internacional dada ao país e destacámos o papel da ajuda humanitária de emergência que terá assegurado funções de cariz social das quais o Governo se desresponsabilizou. Apesar dos esforços de coordenação, verificaram-se falhas na resposta internacional. Segundo autores como BALL & CAMPBELL (1998:8), naquela não terá sido traçada uma abordagem global e abrangente e os CAPs foram limitados face à complexidade estrutural da crise angolana. Foram ainda apontadas algumas críticas à ajuda por não ter estabelecido uma ponte entre a emergência, a reabilitação, o desenvolvimento e a sustentabilidade económica, áreas que se interligam, como vimos mais atrás, e que deverão ser asseguradas num conflito de três décadas. Quanto à forma como a ajuda terá influenciado o conflito, concluímos que esta pode ter exercido alguma influência negativa ao tornar-se um dos principais (se não o principal) fornecedor de muitas das funções centrais do Estado, designadamente ao nível da saúde e da distribuição de géneros alimentares. Ainda assim, concluímos que essa ajuda foi fundamental, do ponto de vista da população socorrida, caso contrário o número de vítimas da guerra poderia ter sido muito superior, devido à falta de géneros alimentares, de medicamentos, de técnicos de saúde, etc. Quanto ao problema específico dos deslocados e refugiados de guerra, verificámos também que existiram algumas dificuldades nesse processo, tendo este sido feito com alguma carga política por parte do Governo (e talvez sem a devida imposição por parte da ajuda internacional). Por fim, questionámo-nos sobre a adequação da posição da ajuda internacional face ao interesse do Governo angolano em priorizar a integração nas FAA dos combatentes da UNITA vistos como maior ameaça, tendo concluído que o Governo assumiu plenamente este processo sem a monitorização de terceiros. Caros colegs do ISEDEF, essencialmente “docentes”, depois do debate sobre a guerra civil em Angola, quais os elementos convergentese divergentes entre a FRELIMO e MPLA como movimentos e como partidos? Entre as duas guerras “a de libertação nacional e a de rebeldes da UNITA e da RENAMO”, quais os paradigmas convergentes e divergentes” nestes cenários? Será imperioso priorizar a defesa e segurança do Estado em detrimento da segurança humanitária? Porque? O conceito da guerra dos anos 50 é mesmo em termos da guerra da 4ª da geração? Porque? Qualquer dúvida, ou contribuição, se dirija para meu email: dr.anly1962@gmail.com ou no site:www. dr-anly.blogspot.com “CLUBE DE OPINIAO CIENTIFICA” Contato celular:827138340, Maputo-Moçambique